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A recuperação judicial em tempos de crise

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É preciso ponderar sobre o momento de pedir a recuperação, pois, se for muito tarde, quando a crise já é severa, pode ser que a alternativa seja a falência, por não existir mais o que recuperar.

Os tempos de penumbra econômica ainda parecem estar longe de acabar, especialmente quando tentamos compreender os indicadores macroeconômicos de 2016 . Não é preciso ser especialista para perceber que esse cenário recessivo afeta, cada vez mais, a todos. No caso das empresas, as inúmeras dificuldades têm provocado encolhimentos e até mesmo quebras. Para tentar evitar esse cenário mais desastroso, muitos têm recorrido à recuperação judicial. É uma solução possível quando não há mais condições de se pagar fornecedores, impostos e salários.

Neste ano, marcado pelo maior pedido de recuperação de todos os tempos – o da telefônica Oi –, constata-se que o número de solicitações de recuperação judicial aumentou exponencialmente. Localmente, no estado do Paraná, em cumprimento ao disposto no artigo 196 da Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falências, a Junta Comercial divulga a relação de empresas falidas ou em recuperação judicial. A variação dos números surpreende especialmente em 2015 e 2016. Neste ano, até outubro, foram 83 pedidos de recuperação, contra 23 em todo o ano passado. Em âmbito nacional, dados divulgados por empresas de análise de crédito revelam que os pedidos de recuperação judicial e as recuperações judiciais deferidas no acumulado do ano registraram alta de 70,2% e 68,1%, respectivamente.

As empresas mais atingidas são, de longe, as de porte pequeno, que têm menor acesso a crédito e menor peso econômico negocial. Além disso, os mesmos estudos mostram que o setor de serviços é o mais prejudicado, sendo campeão nos pedidos de falência (39%), em comparação com o setor industrial (36%) e do comércio (25%).

Como visto, apesar do elevado número de empresas falidas em 2015, nota-se que em 2016 houve maior busca por recuperações judiciais, ou seja: os empresários, endividados, estão tentando salvar seus negócios. A recuperação judicial, diz o artigo 47 da Lei de Recuperação Judicial, tem por objetivo “viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.

A grande vantagem deste processo é obter um fôlego em relação aos pagamentos dos credores, pois o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende, por 180 dias, o curso da prescrição das ações e execuções existentes contra o devedor. Esse prazo é, a rigor, improrrogável, mas o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que as peculiaridades de algumas situações justificam a ampliação desse prazo, em prol da finalidade maior: a recuperação da empresa.

Nesse contexto, é possível obstar, judicialmente, a venda ou retirada dos bens considerados essenciais à atividade da empresa em recuperação judicial, tanto após o decurso do prazo de suspensão como em relação aos bens objeto de propriedade fiduciária. Essa medida é essencial para que a empresa continue a produzir e possa cumprir com seu plano de recuperação aprovado pelos credores. É evidente que as empresas só podem voltar a dar lucro se mantiverem os meios para continuar a produzir ou prestar serviços.

Além disso, é preciso ponderar sobre o momento de pedir a recuperação, pois, se for muito tarde, quando a crise já é severa, pode ser que a alternativa seja a falência, por não existir mais o que se recuperar. Adicionalmente, é preciso que a sociedade detenha o mínimo de recursos para promover a recuperação judicial, cujos custos são elevados. Há necessidade de se arcar com o pagamento de consultores para avaliar previamente a efetiva situação econômico-financeira da empresa e estruturar um plano de reerguimento viável. Também haverá despesas com pagamento de advogados e auditores, convocações e realização de assembleias de credores, honorários do administrador judicial (que pode ser de até 5% do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial) e a própria reestruturação da empresa e execução do plano de recuperação.

Tudo isso ocorre em meio a dificuldades de obtenção de crédito pela empresa e sem poder contar com parcelamentos fiscais especiais que poderiam existir para empresas em recuperação judicial. Aliás, o atraso no pagamento de tributos deverá ser tratado separadamente da recuperação, já que, segundo o artigo 6.º, § 7º, da Lei de Recuperação Judicial, “as execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica”.

O Fisco continua um credor voraz e não renegocia as dívidas, o que acaba sendo um dos principais obstáculos no curso de uma recuperação judicial. Nesse contexto, o plano de reerguimento da empresa deve incluir um contingenciamento necessário para fazer frente aos passivos tributários. A ausência dessa previsão pode ensejar até a não homologação judicial do plano de recuperação aprovado pela assembleia geral de credores.

Em tempos de crise acentuada, esse aspecto deveria ser repensado pelos poderes Executivo e Legislativo, pois a empresa em recuperação judicial poderia participar de um plano especial de refinanciamento de seus débitos, com carência para início dos pagamentos. De nada adianta o Fisco ser um credor especial das empresas se elas deixarão de existir no curto ou médio prazo. É preciso que se incentive a produção econômica e o reerguimento dos entes produtivos, severamente afetados por esta crise prolongada.

Diante de parcas perspectivas de melhoria rápida da economia no Brasil, é de se esperar que o número de pedidos de recuperação judicial continue significativo nos próximos anos. Isso demanda, do empresário, uma atenção maior ao seu negócio, antevendo os sinais de crises internas para atuar proativamente, sob pena de não haver o que resgatar ou não reunir as condições necessárias para promover a recuperação judicial. Por outro lado, compete ao governo desenvolver mecanismos efetivos para promover o êxito da recuperação das empresas, não só no âmbito do Judiciário.

Autor(a)
Cícero José Zanetti de Oliveira

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