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Solução em Foco - Dispute Board

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PARTICIPANTES: ELIAS MUBARAK (MODERADOR, PRESIDENTE DO MEDARB RB, SÓCIO DE MUBARAK ADVOGADOS ASSOCIADOS); 
•    ALEXANDRE GONÇALVES (DEBATEDOR E SÓCIO DE GONÇALVES E RODRIGUES ADVOGADOS ASSOCIADOS); 
•    JÚLIO BUENO (DEBATEDOR E SÓCIO DE PINHEIRO NETO ADVOGADOS); E 
•    JULIANA LOSS ANDRADE (DEBATEDORA, DIRETORA EXECUTIVA | FGV CÂMARA DE MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM, SÓCIA DE LOSS ANDRADE MEDIAÇÕES) 

PALAVRAS-CHAVE: 

Dispute Board – Recuperação Judicial. 

SUMÁRIO: 

1. Introdução.
2. Panorama geral do Dispute Board no Brasil.
3. DRFB e a experiência internacional do Dispute Board.
4. Estudo sobre Dispute Board no âmbito do Judiciário e Legislativo.
5. Considerações finais.

1. INTRODUÇÃO

No dia 23 de novembro de 2023, a TMA Brasil promoveu evento online, da série “Solução em Foco”, que teve como tema o “Dispute Board”. 

O debate foi moderado por Elias Mubarak, presidente do MedArbRB e sócio de Mubarak Advogados Associados, e teve como debatedores Alexandre Gonçalves, sócio de Gonçalves e Rodrigues Advogados Associados, Júlio Bueno, Sócio de Pinheiro Neto Advogados e Juliana Loss Andrade, Diretora-Executiva da FGV Câmara de Mediação e Arbitragem e Sócia de Loss Andrade Mediações. Ainda, na função de relator do debate, Caio Campello de Menezes, Sócio de Campello de Menezes ADR. 

Feitas as apresentações iniciais, a abertura do debate foi direcionada ao moderador Elias Mubarak.

2. PANORAMA GERAL DO DISPUTE BOARD NO BRASIL

Na visão do debatedor Alexandre Gonçalves, nos últimos anos houve um aumento de pedidos de empresas em Recuperação Judicial e o Dispute Board pode ser mais uma eficiente ferramenta para contribuir no cenário de reestruturação de dívidas.

Os métodos adequados de solução de controvérsia têm crescido nos últimos tempos no nosso ordenamento jurídico, seguindo uma tendência de prevenção de conflitos. Tais métodos foram muito bem recepcionados e, hoje, a autocomposição é fortemente estimulada. 

Exemplo disso foi a promulgação da Lei de Arbitragem, em 1996, da Lei de Mediação, em 2015, e mais recentemente da Resolução no. 125 do Conselho Nacional de Justiça, que trata da política pública de resolução adequado de conflitos. Esse movimento legislativo veio a consolidar as formas alternativas de resolução de controvérsias, trazendo mais efetividade e rapidez.

O Dispute Board é mais uma ferramenta de sucesso devido ao seu alto grau de eficácia, justamente porque evita o escalonamento dos conflitos oriundos em contratos de longa duração, contribuindo para o cumprimento do contrato. Ao mesmo tempo, o Dispute Board contribui a evitar a morosidade de um processo judicial ou arbitral, bem como os altos custos neles envolvidos. 
 

A forma colaborativa que o Dispute Board promove para as soluções consensuais de controvérsias está muito vinculado à sua flexibilidade. Proporciona vários modelos possíveis de composição de painel e de recomendações e decisões. Com isso, o Dispute Board pode ser adaptado conforme as especificidades das partes envolvidas, o tipo de contrato em execução e a forma de participação dos membros do painel. A alta adaptabilidade do Dispute Board pode, portanto, acomodar as nuances específicas de cada caso, em contextos diversos.

O debatedor mencionou a existência do Dispute Board permanente e do Dispute Board ad hoc, sendo que o primeiro é constituído desde a origem do contrato, e o segundo é formado à medida em que o conflito surge. Da mesma forma, as partes podem estabelecer qual é o grau vinculante da recomendação ou decisão a ser proferida pelo painel do Dispute Board. Nesse sentido, as partes optam se o painel apenas fará recomendações de caráter não vinculante, de natureza meramente orientativa, ou se decidirá as questões de forma vinculativa e mandatória entre as partes (adjudicação). Há, ainda, a possibilidade de combinação desses dois modelos (recomendação e adjudicação), de forma que o painel de Dispute Board poderá ou recomendar ou decidir, conforme as demandas em concreto.

Nesse contexto de tendência de práticas menos litigiosas, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial passaram a exigir a aplicação do Dispute Board no momento de concessão de financiamentos. Isso aconteceu, por exemplo, nos financiamentos destinados à construção do Eurotúnel, entre Inglaterra e França, e o aeroporto de Hong-Kong. 

No Brasil, a nova Lei de Licitações reconheceu o alto grau de aceitação das decisões e recomendações dos painéis de Dispute Board em contratos com a Administração Pública, prevendo no seu art. 151 a possibilidade de aplicação do Dispute Board, assim como da mediação e arbitragem. A Lei Municipal de São Paulo no. 16.873 (regulamentado pelo Decreto no. 60.607)  passou a prever a constituição do Dispute Board em contratos superiores a R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de Reais).

Segundo dados do Dispute Resolution Board Foundation (DRBF), estima-se que 97% das divergências contratuais são resolvidas ao longo da execução do contrato. Também se estima que o Dispute Board tem um custo baixo em comparação ao orçamento global da obra, representando apenas 0.25%.

O debatedor concluiu, afirmando que o Dispute Board tem muito a contribuir como método adequado de solução de controvérsias, contribuindo para reduzir a cultura da litigiosidade no Brasil. Na sua visão, deve ser considerado como uma eficiente proposta da iniciativa privada em combate à judicialização, e que vem sendo bem recepcionada pelo Poder Público. O próprio Conselho de Justiça Federal, durante a Primeira Jornada de Prevenção e Solução de Conflitos, emitiu 3 anunciados sobre os comitês de resolução de conflitos, recomendando a inclusão de cláusulas de Dispute Board em contratos de infraestrutura.

O debatedor acredita que a sua utilidade também pode se estender a casos de Recuperação Judicial, nos quais a mediação também vem sendo aplicada, promovendo mecanismos de soluções consensuais e acordos privados entre devedores e credores.

Após a fala do debatedor Dr. Alexandre Gonçalves, o moderador do painel, Dr. Elias Mubarak, tomou a palavra para reforçar a necessidade de divulgação e propagação do instituto do Dispute Board no Brasil, que foi positivada recentemente na nova Lei de Licitações. Ele acredita que as pessoas devem começar a entender melhor as vantagens que o Dispute Board oferece, principalmente como ferramenta que pode ser utilizado no curso da execução de contratos complexos. 

No âmbito da Recuperação Judicial, o moderador entende que o Dispute Board pode também ser aplicado, tendo inclusive sido discutido na reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falências como uma opção a ser considerada, mas que no final não constou do texto aprovado da referida lei.

3. DRBF E A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL DO DISPUTE BOARD

O debatedor Júlio Bueno iniciou a sua fala para fazer uma distinção entre as formas de resolução de disputas, destacando haver um mecanismo que resolve a controvérsia de forma definitiva (a mais tradicional sendo a resolução judicial), e de outro lado uma série de formas alternativas, que não trazem uma solução definitiva para o conflito (mas que pode evitá-lo), como é o caso da mediação (positivada no Brasil desde 2015), o expert determination e o Dispute Board (para tratar de contratos e relações complexas e de longa duração).
 
Abordou, na sequência, a origem do Dispute Resolution Board Foundation (DRBF), que nasceu nos anos 80 a partir de uma iniciativa do Banco Mundial, tornando o Dispute Board obrigatório para contratos de financiamento superiores a USD 20 milhões (vinte milhões de dólares) em projetos de infraestrutura de grande porte. 

Hoje, entidades multilaterais de financiamentos em diversos países aplicam o Dispute Board de forma obrigatória, inspiradas por essa iniciativa do Banco Mundial. O Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) deve seguir essa mesma tendência, incorporando o Dispute Board nos financiamentos concedidos no âmbito de projetos de construção.

O Dispute Board passou a se desenvolver mais fortemente no common law, sendo influenciado por experiências de engenheiros do Reino Unido, que passaram a acompanhar as grandes obras, apresentando recomendações às partes durante a execução dos contratos, especialmente no setor de infraestrutura. A Federation Internationale des Ingenieurs Counseils (FIDIC) prevê, desde 1953, o Dispute Board nos seus modelos padrão de contratação no setor da construção. 

No Brasil, o Dispute Board foi inicialmente aplicado nos casos envolvendo a Linha 4 do Metrô de São Paulo, sendo o primeiro país na América Latina a adotar o Dispute Board, sendo posteriormente seguido por Peru, Chile e Colômbia. 

Existe hoje um esforço muito grande no Brasil para que o Dispute Board seja previsto em lei específica (a exemplo da mediação e arbitragem), para que haja um aumento no nível de conhecimento desse instituto, inclusive pela Administração Pública. 

Nesse sentido, salientou a grande vitória recente pelo fato de o Dispute Board ter sido, expressamente, previsto na nova Lei de Licitações, ao lado da mediação e arbitragem. Essa conquista decorreu em grande medida de discussões com o Tribunal de Contas da União e diversos agentes reguladores, principalmente em audiências públicas com ANTT.

O Dispute Board tornou-se uma opção para relações contratuais de maior complexidade e com longo prazo de duração, justamente para proporcionar a continuidade das relações e da execução do contrato até o final. Dados do DRBF revelam a grande evolução da eficácia do Dispute Board nos projetos de infraestrutura, na medida em que 97% das disputas em projetos que utilizam o Dispute Board são resolvidas no curso da execução dos contratos. 

O painel de neutros do Dispute Board, a depender do formato pelo qual foi instituído, determina o que entende como sendo algo mais adequado e razoável para aquela controvérsia, fazendo uma recomendação (no caso do “Dispute Review Board”) ou determinando a solução definitiva do problema concreto (no caso do “Dispute Adjudication Board”). 

A vantagem do Dispute Board é justamente permitir a participação de um terceiro neutro, que adotará posicionamento claro e isento em relação ao problema que lhe é colocado pelos contratantes, apresentando cenários possíveis de solução às partes. Com isso, há uma maior flexibilização da posição adversarial dos contratantes, conferindo liberdade e autoridade aos membros do Dispute Board para convencer as partes sobre a necessidade de uma solução autocompositiva.

Como instrumento de acompanhamento do projeto, o Dispute Board pode ser estabelecido no momento em que ainda nenhum conflito existe. Os membros já são indicados desde o início, passando a conhecer e a acompanhar a execução do contrato com maior proximidade e profundidade. O Dispute Board desmistifica a relação adversarial que se coloca entre os contratantes, relativizando a litigiosidade, mostrando os caminhos mais adequados ao longo da execução do contrato.

No âmbito das Recuperações Judiciais, o Dispute Board pode se tornar uma realidade, considerando que o processo de recuperação judicial envolve relações jurídicas complexas e continuadas entre devedores e credores, contando com alto grau de litigiosidade entre as multipartes envolvidas no processo. 

Pode servir como ferramenta para preservar a boa relação da empresa em recuperação judicial e os demais agentes. Assim, ao lado da mediação no contexto de recuperações judiciais, que já vem sendo aplicada com eficiência, o Dispute Board deve também ser considerado para lidar com as necessidades e realidades específicas dos processos de recuperação judicial. Assim, recomenda que um projeto específico seja pensado para a aplicação do Dispute Board no contexto de empresas em dificuldades financeiras.

Após a fala do debatedor Dr. Júlio Bueno, o moderador do painel, Dr. Elias Mubarak, teceu comentários adicionais sobre a adequação do Dispute Board no âmbito das recuperações judiciais, cujos procedimentos e planos de recuperação judicial têm se tornado cada vez mais sofisticados e complexos. Reforçou a necessidade de se pensar como aplicar esse conceito na prática, principalmente para acompanhamento dos planos aprovados, incluindo atividades como venda de ativos e de unidades produtivas das empresas em recuperação. Acredita que as autoridades brasileiras devem estar mais abertas a entender as vantagens do Dispute Board, seguindo exemplos internacionais, como o Banco Mundial.

4. ESTUDO SOBRE DISPUTE BOARD NO ÂMBITO DO JUDICIÁRIO E LEGISLATIVO

A debatedora Juliana Loss iniciou a discussão, abordando como o Judiciário e o Legislativo têm enxergado o Dispute Board, bem como enfatizando a importância da adequação daquele instituto às reestruturações empresariais. Salientou o papel fundamental do Ministro Salomão nos avanços dos métodos adequados de soluções de controvérsias no Brasil, como a promulgação da Lei de Mediação e a reforma da Lei de Arbitragem.

O estudo do Centro de Inovação e Administração e Pesquisa do Judiciário, liderado pelo Ministro Salomão, serviu para apurar quais tribunais já haviam se manifestado em relação ao Dispute Board, identificando quais assuntos e demandas teriam sido levados ao Judiciário, em quais setores da economia e, principalmente, como os tribunais teriam reconhecido a vinculação jurídica da cláusula de Dispute Board e a vinculação das decisões e recomendações do Dispute Board.

Segundo a debatedora, o Judiciário entende que o Dispute Board não tem a pretensão de dar a última palavra (como no caso da arbitragem, por exemplo), de modo que o Dispute Board não poderia ser desqualificado por emitir simplesmente uma recomendação técnica momentânea e provisória para aquele conflito, reduzindo os danos.  

O estudo identificou 54 decisões proferidas por todos os Tribunais de Justiça Estaduais, Tribunais Regionais Federais, Tribunais de Contas e Superior Tribunal de Justiça. Na grande maioria das vezes, esses tribunais tendem a manter as decisões técnicas do Dispute Board, o que é um sinalizador positivo, pois reconheceu as atividades (recomendações ou decisões) da equipe técnica do Dispute Board.

Nas decisões judiciais analisadas, que pouco fizeram referência à doutrina sobre o assunto, notou-se que os magistrados não fizeram distinção entre as recomendações e as decisões do Dispute Board, tratando a natureza de ambas de forma similar, sem impactos práticos para as decisões judiciais. Além disso, a grande maioria das decisões judiciais manteve a decisão do Dispute Board.

Também foi revelado no estudo que a Administração Pública está muito presente nas discussões levadas ao Poder Judiciário com relação às matérias relacionadas ao Dispute Board, especialmente em casos do setor de construção, com a participação ativa da ANTT e Tribunal de Contas da União.

A debatedora recomenda a produção de mais material acadêmico de cunho pedagógico para que haja uma maior divulgação e, consequentemente, evolução do instituto do Dispute Board no Brasil. Também se mostrou favorável à promulgação de normas para regulamentar o Dispute Board, por entender que essa normatização chancelaria a prática desse instituto no país, como ocorreu com a mediação no âmbito da recuperação judicial.

A debatedora também fez menção à existência de um projeto de lei, que trataria da regulamentação do Dispute Board no Brasil. Mencionou que já houve o envio de Nota Técnica por parte da FGV para o Relator do referido projeto de lei, para fins de compartilhar material sobre o assunto.

Por fim, salientou que o Dispute Board poderia ser muito útil se aplicado no acompanhamento dos financiamentos novos trazidos pelo DIP Finance no âmbito de recuperações judiciais, ajudando a compor os diferentes interesses e a monitorar todo o processo de financiamento concedido à empresa em recuperação, que envolve multiatores em um processo de longo prazo. 

Após a fala da debatedora Dra. Juliana Loss, o moderador do painel, Dr. Elias Mubarak, comentou sobre o resultado do estudo, ressaltando que as partes passam a ter mais conforto e segurança para adotar o Dispute Board, sabendo que o Poder Judiciário vem respeitando as recomendações e decisões do Dispute Board. 

    O moderador fez ainda uma analogia com a mediação no âmbito das recuperações judiciais, lembrando que é fundamental inserir a discussão do Dispute Board em congressos e seminários de insolvência, de modo a divulgar ainda mais o instituto, a exemplo do que foi feito com a mediação no passado. 

Reforçou a utilidade do Dispute Board em casos de DIP Finance para fins de acompanhamento do financiamento ao longo dos anos, conferindo maior segurança, previsibilidade e transparência aos credores.
 
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por derradeiro, em considerações finais, o moderador concedeu a palavra ao relator, Caio Campello de Menezes, para apresentar suas impressões e conclusões a respeito dos temas debatidos.

O relator enfatizou o importante caráter educacional da apresentação de hoje e parabenizou o TMA pela iniciativa de ter trazido o assunto sobre Dispute Board para o âmbito de recuperação de empresas, considerando que a matéria é predominantemente discutida no setor de infraestrutura.

Segundo o relator, o Dispute Board também pode ser considerado como uma eficiente ferramenta de prevenção de disputas, especialmente em relações multipartes, envolvendo diversidade de interesses e aplicação de múltiplas matérias, como é o caso de recuperações judiciais, onde há a discussão de assuntos jurídicos, econômicos e financeiros.

O Dispute Board pode trazer neutralidade às discussões ocorridas no curso do processo de recuperação judicial, contribuindo, junto com o Administrador Judicial e o juiz, para reduzir o alto grau de litigiosidade entre devedores e credores. Também foi ressaltada a adaptabilidade e maleabilidade do instituto, que pode ser moldado conforme as necessidades do caso concreto, respeitando as necessidades e interesses das partes.
 

Autor(a)
Caio Campello de Menezes
Informações do autor
Fundador do escritório Campello de Menezes ADR, especializado em negociação, mediação e arbitragem. Com experiência de mais de 23 anos em contencioso estratégico e arbitragem, como advogado e árbitro.
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