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A validade das assembleias de credores

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Em decisão inédita e polêmica, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) anulou plano de recuperação judicial – aprovado pelos credores em assembleia-geral, e homologado em 8 de junho do ano passado – determinando a elaboração e apresentação de nova proposta, em até 60 dias, sob pena de decretação de falência de empresa dedicada à fabricação de cerâmica, com sede em Suzano. Recentemente, novamente sob ameaça de falência, o mesmo tribunal anulou o plano de recuperação previamente aprovado pela assembleia de credores, desta vez de empresa do setor sucroalcooleiro.

Referidas decisões são polêmicas e vão contra um importante princípio da recuperação judicial, qual seja, o de que a assembleia-geral é soberana em suas decisões. Esse princípio encontra-se expresso diretamente na Lei nº 11.101, de 2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.

Senão vejamos: o artigo 35, inciso I alínea ‘a’ reza que “a assembleia-geral de credores terá por atribuições deliberar (na recuperação judicial) sobre a aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor”.

Perceba-se que em nenhum momento, nesse artigo ou em qualquer outro, a legislação sequer cogita da extensão deste poder de deliberação ao Poder Judiciário.

Qual o fundamento do ativismo judicial, se falência não interessa aos credores?

Posteriormente, em seu artigo 56, a legislação determina que “havendo objeção de qualquer credor ao plano de recuperação judicial, o juiz convocará a assembleia-geral de credores para deliberar sobre o plano”, sendo que o § 4º do referido artigo consigna, ainda, que “rejeitado o plano de recuperação pela assembleia-geral de credores, o juiz decretará a falência do devedor”.

Ou seja, o ato de decretar falência, realizado pelo juiz, é, neste caso, corolário da rejeição do plano – sublinhe-se -pela assembleia-geral de credores.

Embora o artigo supracitado pareça indicar que a decretação de falência ocorreria somente no contexto de não aprovação do plano pela assembleia-geral, o artigo 73 amplia o leque de possibilidades ao prever, ademais desta hipótese, as seguintes: (i) por deliberação da assembleia-geral de credores, na forma do artigo 42 da lei; (ii) pela não apresentação, pelo devedor, do plano de recuperação no prazo legal; (iii) por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação; (iv) por inadimplemento de obrigação não sujeita à recuperação judicial, nos termos legais, ou por prática de ato previsto no inciso III do caput do artigo 94 desta lei.

Esmiuçados os pormenores legais, que bem elucidam, primeiro, que a não aprovação do plano trata-se de competência única e exclusiva da assembleia de credores, e, segundo, que as únicas possibilidades de decretação de falência são aquelas que se encontram elencadas no artigo 73 do diploma legal (razão pela qual se entende o rol como numerus clausus), vemos, então, claramente exsurgir da legislação o princípio norteador da Lei de Recuperação Judicial, expresso em seu artigo 47, que dispõe:

“a recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.

Ora, se o interesse dos credores os leva, por maioria, a aprovar um plano de recuperação – mesmo que, eventualmente, em sacrifício de interesses eventualmente contrários – qual o fundamento legal para o ativismo judicial, quando a falência desinteressa à comunidade de credores (dentre eles, trabalhadores)? Qual a legitimidade para tal decisão?

O desembargador Manoel Pereira Calças, relator do julgado que inovou na matéria, cita em seu voto Sócrates e Platão: “as leis é que são soberanas, não os homens”. Porém, com a devida vênia, na prática é justamente o contrário que está a preconizar a decisão em questão, pois a lei atual desautoriza a autoridade judiciária a violar o espaço de liberdade e soberania de deliberação conferida à comunidade dos credores.

A matéria ainda deverá ser revista pelo STJ, instância em que se espera venha a ser restabelecido o respaldo do poder judiciário à interpretação que se avista mais precisa da atual Lei que regula a recuperação judicial. 

Autores: Daniel Báril e Ricardo Ranzolin, sócios do Silveiro Advogados

Fonte: http://www.valor.com.br (22/05/2012)

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