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A eficácia da novação na recuperação judicial

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Recente acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) - Recurso Especial nº 1.326.888 - entendeu que "não haveria lógica no sistema se a conservação dos diretos e privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (art. 49, §1º, da Lei nº 11.101/205) dissesse respeito apenas ao interregno temporal que media o deferimento da recuperação e a aprovação do plano, cessando tais diretos após a concessão definitiva com a homologação judicial".

Essa questão ainda não está sedimentada pela jurisprudência, tampouco pela doutrina. A novação de uma dívida pode ser definida como a constituição de uma nova obrigação em substituição à obrigação original (art. 360, Código Civil Brasileiro de 2002).

O ordenamento jurídico brasileiro prevê dois regimes distintos: um tratado no próprio Código Civil de 2002 (CC/02), e outro objeto da Lei 11.101. Enquanto a novação civil traz como regra a extinção das garantias da dívida principal, a novação prevista na Lei de Falências traz como regra a manutenção das aludidas garantias sobretudo as reais, que só deverão ser extintas ou substituídas com a aprovação expressa do credor titular da garantia correspondente.

Há uma incoerência no entendimento de que os avalistas podem ser executados por dívida contemplada em plano de recuperação judicial

Dessa forma, a aprovação do plano de recuperação judicial implica a novação das dívidas nele incluídas; contudo, as garantias reais ou fidejussórias deverão ser preservadas, circunstância em que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções ajuizadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral, independentemente de previsão constante do plano. Ao que nos parece esse entendimento poderá acarretar graves prejuízos à aplicabilidade da Lei 11.101, uma vez que compromete a própria essência da lei.

De imediato, pode-se afirmar que há uma incoerência lógico-jurídica no entendimento que reconhece que os avalistas ou fiadores - em sua maioria, sócios das empresas em recuperação judicial - possam ser executados por dívida contemplada para adimplemento em plano de recuperação judicial aprovado, dado que seria o mesmo que admitir a existência da nova dívida e a sobrevivência da dívida antiga. Em outras palavras, estar-se-ia diante de uma deturpação do próprio instituto da novação e do próprio direito civil brasileiro, o qual coíbe a possibilidade de se cobrar duas vezes ou de duas formas distintas o mesmo débito.

Nesse ponto, nada impede que a legislação preveja, como de fato o faz, que, uma vez decretada a falência de uma empresa pelo descumprimento do plano de recuperação judicial, os credores tenham reconstituídos seus direitos e garantias nas mesmas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos. Entretanto, o que não se pode admitir é a permanência de uma dívida extinta pela novação, que sequer precisaria estar prevista no art. 59 da Lei 11.101, na medida em que se trata de um efeito lógico da aprovação do plano de recuperação judicial, o qual objetiva, principalmente, a preservação dos créditos em novas condições de adimplemento.

Assim, conferindo-se aplicação adequada da figura da novação ao tema da recuperação judicial, é possível afirmar que, após a aprovação judicial do plano, a empresa em regime de recuperação judicial está obrigada a cumprir as novas obrigações assumidas, devendo-se, por conseguinte, os devedores solidários, na qualidade de garantidores da obrigação extinta - salvo se o plano for descumprido, hipótese em que as obrigações deverão voltar ao seu estado original, respeitando-se as garantias - responderem, também, pela dívida novada até o cumprimento do plano aprovado.

Da mesma forma, nada justifica a persistência da obrigação do coobrigado no que tange ao cumprimento do valor integral do crédito principal, mesmo após a novação e o pagamento da dívida nos ternos do plano de recuperação judicial. De acordo com tal entendimento, mesmo após a novação da dívida, o coobrigado permaneceria responsável pelo pagamento da diferença até que o valor primitivo fosse quitado, o que, mais uma vez, ofende a "ratio essendi" tanto da novação quanto da recuperação.

Se o plano prevê a novação das dívidas submetidas à recuperação, isso quer dizer que as originais foram automaticamente substituídas pelas condições previstas no referido plano e, se este foi cumprido, não há como subsistir a obrigação de pagamento da diferença por parte do coobrigado.

Nesse diapasão, caso a dívida tenha sido quitada na forma do plano de recuperação judicial, não subsiste qualquer possibilidade de cobrança, seja em que esfera for, estando inequivocamente extinta a obrigação.

Por todo o exposto, conclui-se que não há que se falar em cobrança do coobrigado do valor integral do débito submetido à recuperação judicial quando ocorre o cumprimento do plano pelo devedor principal. Interpretação contrária sobre o tema implicaria a introdução de enorme incerteza e insegurança no processo de recuperação, a ponto de colocar-se em risco a viabilidade de todo o sistema idealizado pela lei.

Autor(a)
Juliana Bumachar
Informações do autor
Juliana Bumachar é sócia fundadora da Bumachar Advogados e Associados Miriam E. Levy Heller, advogada plena.

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