No dia 09/05/2024, foi realizado, de forma híbrida o 2º Congresso Nacional do Fórum de Recuperação Empresarial e Falências (Fonaref) na sede do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em Brasília. O Congresso contou com debates a respeito da construção de propostas de regramentos/orientação para a advocacia e para a magistratura sobre o tema da Insolvência, organizados por salas temáticas, cujas contribuições foram apresentadas em sessão plenária e votadas pelos integrantes do Fórum.
Diferentemente do que ocorreu no 1º Congresso (2023), em que todos os 14 Enunciados foram aprovados, neste, foram propostos 11 Enunciados, sendo que apenas 5 foram aprovados (confira aqui os aprovados).
Nesse diapasão, torna-se interessante analisar os motivos que levaram, desta vez, à rejeição de 6 Enunciados, ressaltando as justificativas e as questões envolvidas. São eles, os Enunciados 02, 04, 06, 09, 10 e 11, descritos na íntegra mais abaixo.
Os Enunciados rejeitados contaram com cuidadosa discussão e tentativas de alteração da redação original, em um esforço de adequá-los para uma possível aprovação.
Enunciados com rejeição por extensa maioria.
Os Enunciados 02, 06 e 11 foram discutidos em plenário e rejeitados por extensa maioria, pelo entendimento de que os temas não estariam estavam maduros para aprovação. Isso porque, segundo os Integrantes, não foi possível chegar a um consenso sobre os pontos relevantes, tais como os marcos temporais, as questões processuais e a exatidão na redação, o que poderia gerar mais dúvidas do que orientações precisas.
O Enunciado 02, que propôs a fixação de um prazo final para a proteção dos ativos essenciais do devedor, mesmo ponderando que os termos propostas já seguem a jurisprudência, não houve consenso em relação à definição deste prazo, se deveria ser, como diz a redação, a partir da decisão da homologação do plano de recuperação judicial, ou do trânsito em julgado de referida decisão, do fim do stay period, ou se deveria ficar à cargo de cada juiz em análise do caso concreto.
O Enunciado 06, que tratou da mediação incidental ao processo de recuperação judicial em curso e da sua não interferência na contagem do stay period trouxe a experiência dos integrantes, que afirmaram se deparar com muitas decisões judiciais acrescentando de forma equivocada 60 dias (previstos na mediação cautelar do §1º do art. 20-B) aos 180 dias do stay period. Ressaltou-se que a intenção do Enunciado era a de prever que a prorrogação para a mediação incidental fosse de tão somente 180 dias prorrogáveis por igual período, sem a possibilidade de extensão deste prazo, mas optou-se pela rejeição, com vistas a amadurecer o debate.
No mesmo sentido foi a rejeição do Enunciado 11, em que se discutiu a possibilidade do deferimento do processamento de uma recuperação judicial em consolidação substancial, com a inclusão de uma empresa do grupo que não exerça regularmente atividade empresarial há mais de 02 (dois) anos. Se de um lado, não incluir uma empresa com menos de 2 anos de exercício no polo ativo do processamento da recuperação judicial possa beneficiar um eventual devedor fraudador, de outro, incluí-la poderá favorecer a recuperação do grupo empresarial, se esta empresa nova foi constituída de boa-fé para garantir operações intercompany. De toda forma, optou-se por amadurecer a proposta.
Enunciados rejeitados por unanimidade
Os Enunciados 04 e 09 foram totalmente rejeitados pela sala temática. O Enunciado 04, que tratou da obrigatoriedade da habilitação de crédito do credor para exercer seu voto na Assembleia Geral de Credores, foi de pronto rejeitado, pois a proposta em si não estava clara, e o texto parecia tratar da hipótese de habilitação retardatária de crédito já prevista em Lei.
A rejeição do Enunciado 09, que previa a possibilidade de o excedente a 150 salários-mínimos do crédito da classe I ter as condições aplicáveis à classe III, inclusive com direito de voto nesta classe, ocorreu por se tratar de proposta que foge à coerência do instituto da recuperação judicial, por pressupor uma antecipação das condições previstas no plano de recuperação judicial antes mesmo de ele ser deliberado ou homologado. Além disso, ressaltou-se o risco de o credor votar por cabeça e por classe, sendo seu voto computado equivocadamente em duplicidade, violando frontalmente a forma de pagamento aos credores, a natureza do crédito e o princípio do par conditio creditorum.
Votação acirrada
O Enunciado 10, que previa a contagem de todos os prazos processuais da Lei 11.101/2005 em dias corridos, inclusive os recursais, foi o único rejeitado por votação acirrada (22 votos a favor da aprovação e 23 votos a favor da rejeição).
O rico debate e as ponderações realizadas pelos integrantes seguem demonstrando a importância do Congresso e do FONAREF, que mais do que contar com a presença de grandes nomes da advocacia e do Poder Judiciário, mantém fervilhantes os temas da Insolvência em prol do enfrentamento e da solução de embates diários e atuais da área, sendo o entendimento pela rejeição de determinados Enunciados, que poderiam gerar mais dúvidas e insegurança jurídica, tão importante quanto a aprovação dos demais.
Íntegra dos Enunciados Rejeitados
ENUNCIADO 02: A proteção do ativo essencial da devedora em recuperação judicial, nas hipóteses do art. 7-A, poderá ocorrer até a homologação judicial do plano de recuperação judicial, não sendo possível impedir o credor não sujeito à recuperação judicial de executar sua garantia depois da concessão da recuperação judicial.
ENUNCIADO 04: É requisito essencial para que o credor possa exercer seu direito de voto na Assembleia Geral de Credores a apresentação de habilitação de crédito, caso este não conste da relação apresentada pelo administrador judicial (art. 7º, § 2º).
ENUNCIADO 06: A mediação incidental ao processo de recuperação judicial já em curso não interfere na contagem do stay period.
ENUNCIADO 09: Prevendo o plano que o excedente a 150 salários-mínimos do crédito da classe I terá as condições aplicáveis à classe III, o credor também terá direito à voto em referida classe, pelo valor excedente.
ENUNCIADO 10: Todos os prazos processuais dos procedimentos de falência e recuperação são contados em dias corridos, inclusive os recursais.
ENUNCIADO 11:Tratando-se de pedido de recuperação judicial em consolidação substancial, havendo pelo menos uma empresa do grupo que exerça regularmente atividade empresarial há mais de 02 (dois) anos, o magistrado poderá deferir o processamento da recuperação judicial em favor de demais empresas do grupo que não exerçam regularmente atividade empresarial há mais de 02 (dois) anos".