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A relevância da comunicação interna na gestão da reestruturação de uma empresa

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No artigo intitulado “A nova face da indústria de turnaround”, escrito por Thomas Felsberg e Eduardo Lemos, publicado em 1 de abril de 2010 na newsletter da TMA Brasil, eles citam “três frentes chaves da reestruturação e recuperação de empresas: na gestão, no financiamento e na esfera jurídica.”

Gostaria neste artigo de contar uma experiência em que, por mais que tivéssemos seguido a implementação das etapas “padrão” de uma reestruturação, não havíamos sido eficazes nas primeiras tentativas de disseminar o plano de reestruturação aos colaboradores da companhia. A dificuldade que enfrentamos na fase inicial da execução do projeto demonstra o quão importante é a comunicação do plano de reestruturação com transparência, credibilidade e entusiasmo diretamente a todos os funcionários; é um componente crítico da frente “chave de gestão”, conforme enfatizam o Eduardo e Thomas no seu artigo.

No artigo “GM: Lições de uma recuperação” publicado no site da TMA Brasil, Telmo Schoeler cita as principais etapas de uma reestruturação:

  • Ter um plano profundo e adequadamente preparado para a reversão;
  • Todos os interessados (i.e. ”prejudicados”) precisam reconhecer perdas e estar dispostos a enfrentar o problema  e pagar o preço de uma solução;
  • Salvo em raríssimos casos, ter uma nova diretoria focada no futuro, pois os executivos existentes não têm autocritica, isenção e coragem para a tomada de ações que sempre serão duras e envolverão mudanças radicais em oposição ao que fizeram no passado; e
  • Nenhuma recuperação é possível sem a injeção de dinheiro novo, o qual, salvo na eventualidade que haja ativos atrativos e líquidos passíveis de serem “desimobilizados”, terá que ser aportado pelos atuais acionistas, atuais credores ou novos acionistas.

Shoeler cita a importância de quebrar paradigmas enraizados na empresa durante uma reestruturação. Podemos, então, concluir que um dos grandes desafios para o novo gestor de uma reestruturação, em que os funcionários geralmente estão sob grande pressão, é convencê-los da viabilidade do seu plano, da sua credibilidade, da sua ética e da sua capacidade de liderança.

O renomado livro “Quem Mexeu no Meu Queijo”, escrito por Dr. Spencer Johnson, tem sido uma ferramenta que eu e meus colegas temos utilizado em diversas ocasiões com a liderança (dos gerentes até o nível de supervisor) da companhia-alvo, para ajudá-los a lidar com a situação dinâmica e traumática de uma reestruturação. A parábola mostra que a vida não é necessariamente um caminho livre de obstáculos, mas sim um caminho repleto de sobressaltos e adversidades. A diferença é a maneira com que cada ser humano lida com tais adversidades.

Nestes seminários, discutimos as implicações da parábola aplicadas ao momento que a empresa vive. Em seguida, aproveitamos para compartilhar com a liderança o nosso plano de reestruturação com a maior transparência possível, deixando cada novo gestor sênior apresentar uma parte do plano; permitimos passar para o grupo que somos um time coeso sem divisões internas, e que todas as informações sobre uma área são compartilhadas com as demais áreas – acabamos com os “silos de silêncio” entre diretorias, o que geralmente se encontra em empresas com dificuldades. Também como resultado deste exercício interativo, conseguimos mensurar o grau de resistência do “middle management” às mudanças que serão necessárias pela frente. É um exercício intenso de comunicação entre o grupo de gestores novos que comandará a reestruturação e a liderança da companhia, e que deve ser feito logo na etapa inicial da reestruturação.

Dito isso, eu presenciei o caso de uma empresa prestadora de serviços de transporte público, em que praticamente todas estas medidas foram tomadas, mas os resultados do plano de reestruturação não apareciam! Revisamos o plano, revisamos as medições dos resultados, convocamos os gerentes inúmeras vezes para explicações e não conseguimos identificar onde estávamos equivocados. Abaixo descrevo o caso e a lição aprendida.

Para entender melhor o contexto deste estudo de caso, descrevo sucintamente a situação geral da companhia. A empresa concessionária sucedeu uma companhia estatal que prestava o serviço de transporte público. À altura desta reestruturação, restavam apenas 107 funcionários herdados da estatal, contra 594 no primeiro dia de operação privada em 1998. Um bloco de acionistas gerou a companhia entre 1998 e 2005, quando houve uma mudança no Conselho de Administração, na Presidência e em três outros cargos do alto escalão da gestão, visando alterar a situação de estagnação e ausência de distribuição de lucro que caracterizava a companhia; era um “early stage turnaround”. Adicionalmente, nos meses subsequentes, houve outras alterações em diversos cargos de coordenação e de gerência, efetuadas pelos novos gestores.

A empresa possuía empregados na sede, no centro de manutenção localizada a 1 km da sede e nas 33 estações distribuídas ao longo de duas linhas de metrô, além de uma frota de quase 70 ônibus. Os funcionários localizados nas estações, nos trens e nos ônibus – que representavam a maior parte da força de trabalho – se localizavam a distância da nova diretoria.

Sendo um discípulo do modelo de gestão em inglês denominado “management by walking around”, eu e outros membros da equipe sênior de gestão, começamos a fazer rondas nas mais diversas áreas da empresa, inclusive nos pontos mais distantes da sede da companhia.

Com base nestas conversas informais, foi elaborada uma pesquisa, que, dentre outros objetivos, visava medir a clareza das novas metas da organização para todos os funcionários. Será que a nova “visão” para a companhia chegava ao nível de “chão de fábrica”? Segregamos as respostas tanto pela época na qual o funcionário foi contratado, quanto pelo seu local físico. O quadro abaixo apresenta os resultados da pesquisa:

 

Clareza das Metas da Organização

Época de Contratação

Funcionários
ex-Estatal

Funcionários contratados
pré-Reestruturação

Funcionários contratados|
pós-Reestruturação

Localização

“Line”

n/a

5,9

9,6

Centro de Manutenção

6,7

7,3

9,0

Sede

5,0

9,2

9,5

Observações:

  • “0” significa o menor grau de clareza, enquanto “10” significa total compreensão.
  • Line: Significam funcionários nas estações e em funções ligadas às estações (inclusive pilotos de trens, etc.)

Estes resultados – empíricos – nos ajudaram a entender o motivo pelo qual a nossa reestruturação não estava sendo executada por grande parte dos funcionários da linha de frente. Tudo era claríssimo quando conversávamos com os nossos colegas de trabalho loteados na sede, mas era evidente que não havíamos conseguido comunicar a nossa mensagem (sobre a importância da quebra de certos paradigmas) claramente aos funcionários contratados anteriormente pela nossa gestão e aos que estavam fisicamente distantes de nós – a nova liderança.

Enfim, este estudo somado às demais iniciativas de coleta de informações através da área de recursos humanos, nos permitiu reformular a nossa estratégia de comunicação interna, sendo o componente mais marcante desta nova estratégia a decisão de “take the show on the road”. Dentro de outras novas iniciativas permanentes de endomarketing, organizamos três palestras com a participação do Presidente e outros Diretores diretamente com todos os funcionários da companhia; foram três palestras para que pudéssemos abranger todos os membros dos três turnos da companhia.

Quanto do êxito da reestruturação pode ser atribuído à nova estratégia intensificada de comunicação interna é impossível de se medir perante as outras ações de gestão, mas estou convicto de que o reforço da comunicação direta entre a nova liderança e os funcionários da linha de frente foi uma ação decisiva que potencializou o sucesso de outras medidas operacionais implementadas, em que contamos com o comprometimento excepcional dos nossos colaboradores.

Autor(a)
André Valverde
Informações do autor
André Valverde é executivo da Olimpia Partners e membro do Comitê de Gestão e Finanças da TMA Brasil.
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