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TJSP define critérios econômico-financeiros para planos de recuperação judicial

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A decisão proferida pelo relator Manuel Pereira Calças em Recurso de Agravo de Instrumento apresentado pelo Banco Itaú, declarou a nulidade da aprovação de plano de recuperação pela Assembleia Geral de Credores da Cerâmica Giotoku Ltda., trazendo alguns critérios de natureza econômico-financeira para a validade e eficácia de planos de recuperação judicial.

De forma sucinta, o plano de recuperação anulado estabelecia as seguintes condições: (i) 18 anos para pagamento do principal; (ii) carência de 3 anos; (iii) pagamentos de valor variável e determináveis (mas não determinados) correspondentes a percentuais sobre a receita (ou lucro líquido); (iv) a alocação dos pagamento anuais seria feita da seguinte forma: x. pro-rata tendo por base o  número de credores entre o terceiro e o quinto ano de pagamento (ou seja, todos os credores receberiam o mesmo valor); e y. pro-rata tendo por base os valores dos créditos de cada credor à partir do sexto ano de pagamento (ou seja, os credores com maior crédito receberiam uma parcela maior de pagamento); (v) aplicação da Taxa Referencial  de Juros supressão da correção monetária por três anos, até o início dos pagamentos; (vI) eventual saldo credor existente ao final do prazo de 18 anos seria perdoado.

O TJSP entendeu que o prazo de carência de 3 anos, frequentemente visto em planos de recuperação judicial, como nos casos da BRA Transportes, Grupo Infinity, Varig S/A, dentre outros,  não é aceitável, aparentemente conferindo novo enfoque à interpretação do artigo 61 da Lei 11.101. Segundo esse artigo, uma vez proferida a decisão que concede a recuperação judicial, o devedor permanecerá em recuperação judicial – ou seja, em regime de administração supervisionada pelo administrador judicial – até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até 2 anos depois da referida decisão. O descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano para cumprimento nesse período acarretará a convolação da recuperação em falência. Segundo TJSP, no caso em análise, o prazo de supervisão judicial já terá transcorrido quando houver o vencimento da primeira parcela dos créditos com garantia real e dos créditos quirografários. Isso, por si só, segundo a decisão do TJSP, já seria uma grave violação da Lei 11.101 que deve ser decretada de ofício pelo judiciário.

Quanto à ausência de determinação de valor específico para os pagamentos, que foram estabelecidos na forma de um percentual sobre a receita líquida projetada, o julgado entende que isso impediria que o Poder Judiciário, o Ministério Público, o Comitê de Credores, ou mesmo qualquer credor possam aferir se ocorreu o inadimplemento de obrigação prevista no plano. Assim, o plano deveria prever com clareza, precisão e certeza qual o valor a ser pago a cada credor. Segundo o TJSP, o plano tem que ser líquido para que, em caso de descumprimento, os credores possam “requerer a execução específica ou a falência”. Em outras palavras, para o TJSP o plano deve estabelecer pagamentos em valores determinados, e não determináveis.

A prática de antecipar pagamentos a credores de menor valor -- bastante comum em uma série de planos de recuperação -- passa a ser nula segundo a decisão do TJSP. O plano anulado previa que, durante o terceiro e quinto anos de pagamento, o valor do lucro líquido seria rateado em parcelas iguais, por cabeça, entre a totalidade dos credores. Tal condição teria “o condão de colocar os credores de uma mesma classe (com garantia real e quirografários) em situação de flagrante colisão de interesses, os quais deixam de ter interesses homogêneos e passam a possuir interesses antagônicos, interferindo no resultado final da deliberação assemblear. Os titulares de créditos de menos valor, que receberão seus créditos em curto prazo passam a ter interesse de aprovar a cláusula, enquanto os credores com créditos maiores têm o interesse de rejeitar a proposta uma vez que, além do alongamento do prazo de recebimento, têm praticamente a certeza de não receberão a integralidade de seus créditos e ainda estarão, antecipadamente, perdoando parte de seus créditos em percentuais ignorados”. Segundo o TJSP essa condição representa violação ao princípio do tratamento isonômico dos credores de uma mesma classe (pars conditio creditorum).

Já a supressão parcial da correção monetária pelo período de três anos violaria a Lei 6.899/81. Essa lei determina a aplicação da correção monetária aos débitos judiciais. A decisão do TJSP conclui que a correção monetária é de aplicação obrigatória e que a sua supressão representaria enriquecimento ilícito do devedor sobre os credores. Quanto à aplicação da Taxa Referencial de juros, o TJSP decidiu que não se mostra razoável “a previsão de taxa de juros menor do que a legal, isto é, 1% ao mês, conforme dispõe o artigo 406 do Código Civil.”

O TJSP entendeu, também, que a remissão dos saldos credores não quitados até o 18º ano viola o direito de propriedade garantido pelo artigo 5º., inciso XXII da Constituição Federal. Ainda que a deliberação seja corretamente aprovada pela maioria, o TJSP lança dúvidas sobre o direito de a maioria dos credores determinarem a “supressão de parcela do crédito titularizado por credores minoritários.”

Com relação às condições econômico financeiras como um todo, decidiu o TJSP que o plano “não pode propor o pagamento do passivo em prestações a serem cumpridas por longos anos e valores ínfimos considerados em proporção aos créditos que lhe forem concedidos em sua atividades empresarial, que tenham o potencial de acarretar aos credores sacrifícios superiores aos que eles suportariam no caso de falência da devedora.” Afirma ainda o TJSP que a recuperação somente “pode e deve ser deferida se a empresa devedora mostrar que não se encontra em situação de falência”
E que as condições  prazos de pagamento demasiado longos e parcelas de valor vil ou iníquo evidenciariam “que a empresa não pode ser considerada recuperável por suas próprias forças, mas sim, pelo sacrifício excessivo imposto de forma injusta àqueles que lhe deram crédito por acreditar que ela cumpriria a palavra empenhada.”

Ao nosso ver, a novidade da decisão reside exatamente nos critérios econômico-financeiros traçados, e não no fato de que a soberania da assembleia de credores fica condicionada ao cumprimento da lei e princípios gerais de direito.

Autor(a)
Antonio Carlos Cantisani Mazzuco, João Carlos Toledo
Informações do autor
Antonio Carlos Cantisani Mazzuco é sócio e João Carlos Toledo advogado sênior do Madrona Hong Mazzuco Brandão - Sociedade de  Advogados
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