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Solução em Foco - Desafios e Polêmicas da função do Administrador Judicial

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No dia 21 de setembro de 2022, o TMA Brasil promoveu evento online, da série “Solução em Foco”, que teve como tema “Desafios e polêmicas da função do Administrador Judicial”. O debate foi moderado pelo Dr. Francisco Satiro, sócio de Satiro Advogados, teve como debatedores Dra. Ana Beatriz Moroni, sócia da Deloitte, Dr. Breno Miranda, sócio da Ex Lege Administração Judicial, Sr. Eduardo Seixas, COO e sócio da Alvarez & Marsal Brasil, e Exma. Dra. Maria Rita Rebello Pinho Dias, Juíza da 3ª Vara de Falências e Recuperações Judicial de São Paulo/SP, e ainda, na função de relator, Dr. Eduardo Ruiz, sócio da AJ Ruiz Administração Judicial.

Ao introduzir o tema, Dr. Francisco Satiro ressalvou a mudança de paradigma decorrente da reforma da LRF, que atribuiu novas funções ao auxiliar da justiça, e salientou que a ideia seria discutir e desenvolver os aspectos desafiadores e polêmicos que se revelaram no período pós-reforma. Para tanto, as abordagens foram dividas em três temas: (i) o administrador judicial na recuperação judicial; (ii) o administrador judicial na falência; e (iii) o administrador judicial na recuperação extrajudicial – assunto este novo e inesperado, mas justificável em razão de quantidade significativa de questões relacionadas que surgiram recentemente.

Inicialmente, acerca da atuação do administrador judicial na recuperação judicial, a Dra. Ana Beatriz Moroni fez relevantes ponderações sobre o relatório do plano de recuperação judicial, ressalvando que a determinação de apresentação, atribuída ao auxiliar do juízo na reforma da LFR, acabou uniformizando uma boa prática que já era adotada por parte dos administradores judiciais, ainda que informalmente junto aos magistrados auxiliados, bem como que, após incerteza inicial sobre quais seriam os limites a serem observados pelos administradores judiciais na elaboração deste relatório, a prática acabou por conduzir a um modelo ideal, que tem como principal objetivo levar informações objetivas a todos os credores, das mais variadas condições, sobre a sustentação do plano do ponto de vista econômico e legal, a partir de uma análise técnica.

O Sr. Eduardo Seixas fez pertinentes considerações complementares sobre a questão do relatório do plano de recuperação judicial, mencionado experiências práticas, e passou a tratar de outra importante nova função atribuída ao administrador judicial com a reforma, que é a de assegurar que as negociações entre devedor e credores sejam realizadas dentro dos termos convencionados. Asseverou tratar-se de um grande desafio aos profissionais, na medida em que cada negociação possui características próprias. 

A Dra. Maria Rita R. Dias fez interessantes considerações sobre a questão do relatório do plano de recuperação judicial, afirmando que o grande desafio do judiciário, através dos administradores judiciais, é atuar pela redução das assimetrias e pela equalização de informações entre os credores de diferentes classes e portes, de modo a assegurar que o ambiente de negociação em assembleia seja o mais saudável possível. Na sequência, ponderou que a mediação seria mais uma importante ferramenta (e não uma etapa necessária) para apoiar credores e devedor na busca por soluções durante a negociação e construção do plano de recuperação judicial, cabendo ao administrador judicial incentivar a utilização dessa ferramenta sempre que entender que ela pode contribuir para o sucesso da recuperação judicial.

Ainda sobre a questão da “intervenção” do administrador judicial na negociação entre credores e devedor e comentários dos demais debatedores, a Dra. Ana Beatriz reforçou que a reforma legislativa acabou legitimando uma postura que já era adotada em determinados casos, e trouxe tranquilidade aos auxiliares que, por vezes, viam-se preocupados em eventualmente extrapolar os limites de sua atuação, ainda que agindo na melhor das intenções ao tentar aproximar as partes para uma negociação mais efetiva.

O Dr. Breno Miranda concluiu as ponderações sobre as questões relacionadas à recuperação judicial ressalvando que a partir da fala dos demais debatedores restou evidenciada a importância da figura do administrador judicial dentro do sistema de insolvência empresarial. Asseverou que a reforma legislativa deve ser vista com bons olhos, na medida em que muitas das práticas que já eram adotadas foram positivadas, traduzindo segurança e legitimidade para o trabalho, e ainda, que, ao ampliar significativamente as funções atribuídas ao administrador judicial, a reforma revelou a intenção do legislador de exigir que esses profissionais sejam cada vez mais capacitados e especializados. Destacou a importância do Conselho Nacional de Justiça na discussão das boas práticas dentro do sistema da insolvência e apresentou importante informação sobre esclarecimentos prestados pelo órgão em relação à Resolução nº 393, de maio de 2021, atendendo a consulta feita pela OAB/MT, notadamente no que diz respeito ao limite de nomeações de um mesmo profissional pelos magistrados.
Prosseguindo-se às abordagens relacionadas a atuação do administrador judicial na falência, a Dra. Maria Rita R. Dias expôs sua opinião em relação à importância do administrador judicial na fase de liquidação dos ativos na falência, que ganhou ainda mais relevância com a necessidade de apresentação de um plano de alienação dos bens arrecadados. Tal previsão, a seu ver, trouxe melhor organização, mais transparência e segurança jurídica ao procedimento, reduzindo questionamentos e recursos que poderiam ocorrer ao longo da falência.

A Dra. Ana Beatriz Moroni ressaltou que as questões relacionadas à falência foram as que mais lhe empolgaram na reforma da LRF, destacando em especial os dispositivos que passaram a permitir ao administrador judicial requerer o encerramento de falências em que não há ativos, notadamente o art. 114-A. Reforçou, neste aspecto, a responsabilidade do administrador judicial ao sugerir o encaminhamento do procedimento nesse sentido, que somente deve ocorrer após um criterioso trabalho de pesquisa de existência de bens de propriedade do falido. Reforçou a importância de que falências fadadas ao insucesso deixem de onerar o poder judiciário e, consequentemente, o administrador judicial.

O Sr. Eduardo Seixas, declarando-se um verdadeiro “fã” da falência, onde o papel do administrador judicial passa a ser o de protagonista, reforçou que as melhores alterações trazidas pela reforma estão relacionadas ao procedimento falimentar, com o objetivo de torna-lo mais célere e eficiente. Com relação ao plano de alienação dos ativos, expôs aspectos práticos e ponderou sua relevância para tornar o falido menos beligerante e mais acólito.

O Dr. Breno Miranda ressaltou o aspecto positivo do plano de alienação de ativos, mas fez críticas consistentes em relação a previsão da pena de destituição ao administrador judicial que descumprir o prazo legal de 180 dias estabelecido para venda dos bens, ressalvando a imprescindibilidade de garantia do devido processo legal e da ampla defesa ao administrador judicial, especialmente em razão das consequências nefastas decorrentes da destituição.

Ao abordar aspectos polêmicos relacionados à falência e citados pelo Dr. Francisco e também pela relatoria, os debatedores trataram: 
(i) da alteração da ordem de preferência da remuneração do administrador judicial com o advento da Lei 14.112/2020, tendo a Dra. Maria Rita R. Dias expressado sua opinião no sentido de que a própria LRF resolve a questão ao reconhecer a remuneração do auxiliar como despesa essencial para a condução do processo de falência, e por isso deve ser assegurada; 
(ii) da necessidade de realização da contabilidade das massas falidas, tendo o Sr. Eduardo Seixas feito considerações no sentido de que cada caso deve ser analisado isoladamente, e que a contabilidade, quando necessária, deve ser implementada a partir do levantamento de um novo balanço considerando ativos e passivos da massa, e que, dali em diante, determinadas obrigações acessórias deveriam ser dispensadas, assim como a necessidade de pagamento de tributos; 
(iii) das constrições indevidas que administradores judiciais sofrem sobre seus patrimônios advindas de execuções movidas contra a massa falida, especialmente na justiça do trabalho; e 
(iv) da possibilidade de alocação de recursos financeiros pertencentes às massas falidas em produtos de investimentos variados e em instituições financeiras que não sejam aquelas conveniadas aos tribunais, tendo a Dra. Maria Rita R. Dias expressado sua opinião no sentido de tratar-se de uma forma importante de maximização desse ativo da massa, e de que cabe ao administrador judicial, com as devidas cautelas, levar ao juízo diferentes propostas que justifiquem a diversificação do investimento. Ainda neste tocante, Eduardo Seixas lembrou das dificuldades de obtenção de extratos e da burocracia encontrada junto às instituições financeiras conveniadas, enquanto a Dra. Ana Beatriz Moroni destacou a resistência e a insegurança ainda existente por parte de muitos juízes, especialmente de varas não especializadas.
No mais, o Dr. Breno Miranda compartilhou experiência prática recente de atuação em uma falência continuada que, a seu ver, se mostrou bem-sucedida.

Por fim, passando às abordagens relacionadas a atuação do administrador judicial na recuperação extrajudicial, o Dr. Breno Miranda ponderou a relevância do tema, argumentando que, a despeito da ausência de previsão legal, as características do caso podem sim justificar a nomeação de administrador judicial para auxiliar o juízo na análise das questões impugnadas e do cumprimento dos requisitos legais para homologação do plano.

Já a Dra. Maria Rita R. Dias expressou sua preocupação com a criação de alternativas não previstas em lei, o que pode fazer com que as expectativas dos agentes de mercado sejam quebradas, bem como destacou que a nomeação de administrador judicial em recuperações extrajudiciais deve ser medida absolutamente excepcional.

A Dra. Ana Beatriz Moroni expôs sua opinião pessoal no sentido de que a atuação do administrador judicial na recuperação extrajudicial não é importante ou necessária, mas mencionou experiências práticas em que a nomeação se justificou pela falta de experiência de magistrados não especializados, servindo o administrador judicial, nesses casos, muito mais como um “consultor” imparcial do juízo.

O Sr. Eduardo Seixas corroborou a posição dos colegas no sentido de que a nomeação só deve se dar em casos excepcionais. A partir de provocação do mediador, ponderou inclusive a possibilidade de nomeação de um árbitro para decidir controvérsias sobre créditos submetidos ao plano de recuperação extrajudicial.

Em intervenção pontual desta relatoria, foi ressaltado que as discussões por vezes não se resumem a quantificação e classificação de créditos, mas também a existência de fraudes, notadamente a simulação de crédito entre devedor e credor com o intuito de atingimento do quórum de aprovação do PRE. Ademais, ponderou-se a necessidade de delimitação, por parte do magistrado, do escopo de atuação do administrador judicial, evitando-se assim que as discussões se alonguem e o procedimento se torne complexo.

Finalmente, os debatedores teceram suas considerações finais: (i) Dra. Maria Rita R. Dias destacou a relevância da figura do administrador judicial na condição de auxiliar do juízo, como agente responsável por assegurar transparência ao procedimento e que os objetivos da LRF sejam atingidos; (ii) Dr. Breno Miranda ressaltou que muitas são as funções atribuídas a este profissional, e que o tempo do debate permitiu fosse tratada apenas uma pequena parte delas, devendo, aquele que deseja atuar como administrador judicial, se aprofundar no tema; (iii) Dra. Ana Beatriz Moroni ressaltou a importância de debates do tipo e também reforçou a relevância do papel do administrador judicial e de que seu trabalho seja valorizado e reconhecido, asseverando que as alterações e recomendações recentes somente legitimaram obrigações que na verdade já existiam; e (iv) o Sr. Eduardo Seixas destacou o alinhamento de ideais entre os debatedores e seu desejo pela continuidade da evolução legislativa, especialmente em relação ao procedimento falimentar, para que possamos ter um processo mais célere e eficiente.
 

Autor(a)
Eduardo Ruiz, Sócio da AJ Ruiz Administração Judicial
Informações do autor
Advogado atuante na área de insolvência empresarial, pós-graduando (LL.M.) em Direito Empresarial pelo IBMEC-SP. É sócio da AJ Ruiz Consultoria Empresarial S.A., e membro associado do TMA Brasil - Turnaround Management Association do Brasil.
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