Os bancos Bradesco, Itaú Unibanco e Santander concordaram em vender à Enforce, empresa de recuperação de créditos do BTG Pactual, a dívida de R$ 1,1 bilhão que têm a receber do Grupo Abril. A operação era crucial para colocar em pé a estratégia do advogado Fábio Carvalho, que no fim do ano passado adquiriu as ações da editora, com apoio financeiro do próprio BTG.
A dívida bancária representa 70% do endividamento total da Abril, de R$ 1,6 bilhão. Por isso, as instituições financeiras tinham peso suficiente para aprovar ou rejeitar qualquer plano de recuperação da companhia.
"Superamos mais um importante passo no processo de recuperação do Grupo Abril", afirmou Carvalho, em nota. "Os esforços seguem concentrados não só para a rápida finalização dos contratos e documentos necessários à conclusão da aquisição, mas acima de tudo nas negociações que vão viabilizar a aprovação do plano de recuperação judicial".
A Enforce vai adquirir os créditos dos bancos com 92% de desconto e pagamento à vista. Também ficou acertado que as instituições financeiras receberão a maior parte do dinheiro a ser levantado com a venda da sede da Abril, localizada na Marginal do Tietê, em São Paulo. O edifício foi dado em garantia de uma debênture emitida pelos bancos para a editora, assim como as marcas das revistas mais importantes - "Veja" e "Exame" entre elas. Segundo um interlocutor a par da proposta, o prédio tem de ser vendido em dois anos.
O Bradesco tem R$ 500 milhões dessas debêntures (parte herdada do HSBC); Itaú e Santander têm cerca de R$ 250 milhões cada um. Com a transação, os bancos poderão recuperar até 20% do total que teriam a receber da Abril, segundo uma pessoa que acompanhou as conversas. É um percentual significativo, considerando que as operações com a editora já foram baixadas a prejuízo pelas instituições financeiras.
Os bancos tentavam se desfazer da dívida da Abril pelo menos desde agosto, quando a editora pediu recuperação judicial. Além de considerar o negócio pouco atrativo, as instituições financeiras não queriam ser responsáveis pela eventual falência de uma das editoras mais importantes do país.
Inicialmente, a ideia era fechar o negócio em paralelo à venda das ações. Mas, com uma proposta concorrente no páreo, Carvalho se adiantou para garantir a compra do controle da companhia no fim do ano passado. Para isso, se comprometeu a pagar R$ 100 mil à família Civita, que saiu da empresa.
Além da proposta da Enforce, os bancos tinham duas outras na mesa. Uma delas era de um grupo de empresários e investidores liderados pela butique financeira Guilder, do executivo João Consiglio, que tentou também comprar as ações da editora. Outra, mais recente, foi feita pela Jive, gestora de recursos especializada em recuperação de créditos.
Com isso, os bancos conseguiram melhorar a oferta que tinham em mãos. Originalmente, a Enforce havia proposto desconto de 95% sobre o valor de face da dívida e uma fatia menor relativa à venda do imóvel da Abril.
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou, em janeiro, a compra do controle da editora pela holding Cavalry Investimentos, controlada por Carvalho. O advogado já tinha um relacionamento próximo com o BTG. Ambos atuaram juntos nos casos das varejistas Casa & Vídeo e Leader e também na Bravante, empresa de apoio marítimo no setor de óleo e gás.
Está prevista para março a assembleia de credores da Abril sob o processo de recuperação judicial. Com a Enforce assumindo a dívida no lugar dos bancos, a empresa do BTG passa a ter a maioria dos votos para aprovar um plano de recuperação em comum acordo com Carvalho.
Em dezembro, o advogado disse ao Valor que pretende manter as linhas gerais da proposta já feita pela Abril na recuperação judicial. O plano prevê deságio de 92% nas dívidas restantes, e pagamento ao longo de 18 anos. (Colaboraram Alessandra Bellotto e Alexandre Melo).
21/02/2019