A Odebrecht recebeu do BNDES um sinal positivo sobre as linhas de financiamento à exportação, suspensas para as empresas envolvidas na Operação Lava-Jato desde maio de 2016. O banco pretende iniciar os trâmites que podem levar à liberação de US$ 600 milhões à Odebrecht Engenharia e Construção (OEC) por obras já realizadas fora do Brasil e cujas exportações de bens e serviços estão confirmadas. Os créditos precisam de novo aval da diretoria do banco de fomento, mesmo de linhas anteriormente aprovadas.
Na quinta-feira, um time do alto escalão da Odebrecht esteve na sede do BNDES disposto a definir o futuro das linhas de exportação. Da conversa, conforme fontes que acompanham o caso, saíram respostas animadoras à empresa.
A reunião com a construtora, de acordo com pessoas a par do assunto, foi no dia seguinte à visita do Ministério Público Federal (MPF), quando foi tratada a "plenitude" dos acordos de leniência e o conforto da instituição quanto aos efeitos do compromisso para as empresas. Em dezembro, o grupo Odebrecht aceitou pagar de mais de R$ 7 bilhões no acerto com o órgão brasileiro, a Justiça americana e a suíça - o maior acordo deste tipo já realizado no mundo.
De acordo com pessoas a par do assunto, o banco sinalizou que, além de regularizar essas liberações consideradas em atraso, pode reavaliar a normalização de outros projetos pendentes com linhas já aprovadas e ainda abrir diálogo sobre financiamento a novos projetos. Tudo, porém, após ser submetido à diretoria da casa.
Consultado, o BNDES afirmou que o acordo de leniência "impactou positivamente o cadastro" da Odebrecht. Mas que a liberação de crédito depende de quatro critérios, entre os quais a assinatura de um termo de conformidade - os demais são a existência de "funding", o avanço físico da obra e o risco de crédito do importador.
A OEC, segundo o Valor apurou, já iniciou a corrida para preparar e apresentar os termos de conformidade, garantindo a inexistência de irregularidades nas obras. A construtora esclareceu que os US$ 600 milhões que o banco de fomento tem em atraso atualmente equivalem a 14% do total de recebíveis com a instituição, considerando as linhas de exportação antes aprovadas - US$ 4,3 bilhões.
A conversa com o BNDES trouxe luz à Odebrecht, que voltou a ser assombrada pelo risco de um processo de recuperação judicial vir a ser necessário para reorganizar as finanças. Há uma grande pressão sobre a liquidez da OEC e evidente dificuldade no avanço do programa de venda de ativos, lançado pela holding Odebrecht (ODB) há quase um ano. O grupo tinha dívida líquida de R$ 76,3 bilhões ao fim de junho.
A maior parte das obras contempladas no montante que pode vir a ser liberado pelo BNDES em breve está localizada na América Latina e África. O banco suspendeu linhas de 25 projetos internacionais de várias construtoras nacionais e que somam US$ 7 bilhões, em função da Lava-Jato.
Sem o pagamento das linhas de exportação e sem novos projetos, a construtora vinha queimando caixa, que foi de R$ 10 bilhões para R$ 4,7 bilhões, entre janeiro e setembro de 2016. A OEC ainda não apresentou o balanço anual, mas já alertou aos investidores de seus títulos internacionais que o caixa ficará abaixo de R$ 4 bilhões ao fim de dezembro.
No último trimestre do ano passado, a OEC reduziu o ritmo do avanço de suas obras, fazendo com que toda cadeia de exportação de seus projetos sofresse queda nos volumes comprados e pagos. Com a liberação pelo BNDES, a cadeia volta a ser irrigada.
Nas linhas de exportação, o BNDES financia os governos contratantes da Odebrecht, com compromisso de compra dos bens e serviços brasileiros no projeto. A despeito de o crédito ser ao país estrangeiro, os recursos são pagos à OEC, pois a companhia compra os materiais antecipadamente. O dinheiro chega como um reembolso pelo gasto já realizado.
A construtora do grupo Odebrecht encolheu drasticamente nos últimos anos. Em 2014 e também em 2015, a receita bruta ficou em R$ 34 bilhões. A previsão para o ano passado era de R$ 18 bilhões (US$ 6 bilhões) e, para este ano, a orientação fornecida ao mercado foi de US$ 5 bilhões - R$ 15 bilhões pelo câmbio atual.
A OEC era o negócio mais importante do grupo. Com a Lava-Jato, a posição foi assumida pela petroquímica Braskem, mas que além de outros acionistas - inclusive de mercado - tem seu próprio calvário. Do acordo de R$ 7 bilhões do grupo Odebrecht com o MPF, R$ 3,1 bilhões são da Braskem, sendo que R$ 1,6 bilhão deve ser pago à vista - o débito da ODB tem prazo de 23 anos.
O encolhimento da OEC fará com que o faturamento bruto a ser divulgado pela ODB para 2016 volte a R$ 90 bilhões. Em 2015, o grupo havia passado de R$ 100 bilhões de receita bruta.
Para completar o cenário delicado da ODB, com o enfraquecimento da construtora, a discussão a respeito da suficiência do acordo de leniência assinado com o MPF contribuiu para a demora no fechamento da venda da Odebrecht Ambiental para a Brookfield, transação que traz US$ 768 milhões ao caixa da holding.
A discussão sobre a efetividade do acordo de leniência - entre MPF e Advocacia Geral e União (AGU) - prejudica o avanço do programa de alienação de ativos, cujo objetivo é obter até R$ 12 bilhões em dinheiro e eliminar do balanço dívidas de R$ 17 bilhões.
A Odebrecht diz que os processos de venda seguem o ritmo normal e que as propostas vinculantes para compra da usina hidrelétrica de Chaglla, no Peru, devem chegar até o início de abril. Mesmo assim, o único ativo vendido e pago foi a concessão rodoviária no Peru Rutas de Lima, por R$ 1 bilhão.