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Divergência com russos pode prejudicar plano da Heringer

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Uralkali mantém interesse na aquisição da empresa 

 

No fim de dezembro, a empresa comandada por Dalton Heringer informou que não chegou a um acordo com os russos — Foto: Evandro Monteiro 
Ainda interessada em adquirir o controle da Fertilizantes Heringer, a russa Uralkali deflagrou uma ofensiva para evitar a homologação do plano de recuperação judicial da companhia brasileira. Os russos alegam que o balanço da empresa está inflado e apresenta inconsistências contábeis da ordem de R$ 700 milhões, o que não era de conhecimento dos credores que aprovaram o plano de recuperação judicial em 3 de dezembro. 
A estratégia da Uralkali irritou a Heringer, que pediu à Justiça que os russos sejam investigados por crime falimentar. “Trata-se de uma tentativa deliberada de prejudicar a Heringer, em prejuízo de seus funcionários e credores, com o objetivo de forçar uma venda do controle acionário ou aquisição de ativos de forma indevida e danosa. Medidas criminais e indenizatórias serão adotadas contra os agressores”, afirmou ao Valor o advogado Júlio Mandel, que representa a empresa brasileira no processo de recuperação judicial. 
O litígio entre Uralkali e Heringer começou a ganhar cores no fim de dezembro, quando a oferta de até US$ 115 milhões feita pelos russos para adquirir a empresa naufragou. Àquela altura, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) já havia dado aval para a aquisição. 
Em recuperação judicial há um ano e com dívidas de mais de R$ 2 bilhões, a Heringer parecia ter encontrado um caminho em 23 de setembro, quando a família controladora firmou um acordo com a Uralkali. 
Quando o acordo foi anunciado, haviam duas alternativas para o aporte. Os russos poderiam subscrever integralmente um aumento de capital na empresa de fertilizantes ou comprar a participação de 51,5% da família Heringer e, posteriormente, realizar um aumento de capital para fortalecer as finanças do grupo brasileiro. A Uralkali propôs pagar R$ 2 por ação. Ontem, os papéis fecharam o pregão a R$ 3,91 na B3, o que dá à Heringer um valor de mercado de R$ 210,6 milhões. 
Mas o apetite russo esbarrou na concorrência. Na assembleia de credores que votou o plano de recuperação da Heringer, em 3 de dezembro, a marroquina OCP, que detém 10% de participação na companhia, votou contra a proposta. Embora a resistência da OCP não tenha sido suficiente para barrar a aprovação, a postura já indicava a oposição dos marroquinos à oferta da Uralkali, já que plano de recuperação foi costurado contemplando uma eventual injeção de capital na companhia - como a proposta feita pelos russos. 
Mais tarde, no fim de dezembro, a OCP foi apontada como pivô do término das negociações com a Uralkali. Os marroquinos fazem parte do acordo de acionistas com a família Heringer, assim como a canadense Nutrien, cuja participação acionária é de 9,5%. Fornecedora de fosfatados, a OCP poderia perder um cliente com a venda aos russos. 
O clima entre a Heringer e a Uralkali se tornou menos amistoso após uma auditoria feita pela KPMG - e concluída em 16 de dezembro - alegar inconsistências no balanço da empresa brasileira. Não está claro se os russos propuseram uma mudança nos termos da oferta de aquisição, mas o fato é que a família Heringer decidiu encerrar as negociações, o que levou os russos a exporem parte dos problemas contábeis para os credores. 
Em 20 de janeiro, a Uralkali pediu ao juiz da 2ª Vara Cível de Paulínia que não homologue o plano de recuperação. Nessa solicitação, os russos mencionaram alguns dos resultados da auditoria da KPMG e do escritório de advocacia Demarest, que assessoravam a Uralkali no processo de aquisição. 
De acordo com a petição enviada pela companhia russa, a auditoria concluiu que a Heringer não provisionou R$ 184,6 milhões referentes a processos judiciais cuja perda é considerada provável, o que estaria em desacordo com as normas contábeis. Outro problema apontado pela KPMG diz respeito a créditos tributários de R$ 534,8 milhões - desse valor, R$ 337 milhões já teriam sido negados por autoridades tributárias. Na visão dos russos, o plano de recuperação se tornou inexequível devido às inconsistências contábeis e uma alteração teria de ser feita. 
Na última terça-feira, o administrador judicial do caso recomendou ao juiz que homologue o plano, contrariando a intenção da Uralkali. O administrador considera que os russos não apresentaram evidências das “descobertas”. 
Procurada pelo Valor para comentar os resultados da auditoria da KPMG e do Demarest, a Heringer não respondeu. Em juízo, a empresa argumentou que seu balanço é auditado há anos por empresas com alta reputação. Atualmente, a PwC é a responsável pelo trabalho, mas a firma não vem emitindo conclusões. 
No último relatório de demonstrações financeiras da Heringer, relativas ao terceiro trimestre do ano passado, a PwC se absteve de opinar sobre o balanço financeiro da empresa por considerar que não foi “possível obter evidência de auditoria apropriada e suficiente para fundamentar a nossa opinião”. 
Procuradas, PwC e KPMG informaram que não comentam casos envolvendo clientes. Ao Valor, a Uralkali apenas confirmou que entrou com petição junto à 2ª Vara Cível de Paulínia, sugerindo ao juiz responsável pelo caso a contratação de uma terceira auditoria para apurar esclarecer as potenciais discrepâncias contábeis. 
 

 

06/02/2020

Autor(a)
Por Marina Salles e Luiz Henrique Mendes — De São Paulo

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