Leonardo Chiappetta, um senhor de gestos rápidos e olhos atentos, parece hoje um tantinho mais vagaroso. Uma dor nas costas tem feito um dos vendedores mais conhecidos do Mercado Municipal de São Paulo, dono do empório centenário que leva o nome da família, andar com passos bem miúdos, morosos. O estômago também incomoda - segundo ele, por culpa dos remédios que está tendo de tomar para essa tal dor. A bem da verdade, nada disso parece incomodar tanto Leonardo quanto um documento enviado recentemente para o Tribunal de Justiça do Estado. Sua loja, fundada pelo avô em 1908 e atualmente considerada quase uma instituição paulistana, entrou com pedido de recuperação judicial por força de uma dívida de quase R$ 8 milhões.
Leonardo Chiappetta hesita em comentar, mas foi uma assinatura doída, um documento que o chateia mais do que qualquer sofrimento físico. Ao lado de estabelecimentos como a Casa Godinho e a Casa da Boia, o seu Empório Chiappetta é um dos últimos estabelecimentos comerciais familiares que sobrevivem há mais de um século na capital paulista. A loja, que começou na Avenida São João e se transferiu para o Mercadão em 1933, já passou por três gerações dos Chiappettas e sobreviveu a inúmeras dificuldades, de crises financeiras a enchentes no centro - ainda hoje, com mais de 2 mil produtos, trata-se de um dos mais procurados pontos entre os 291 boxes do mercado.
É justamente toda essa história de empório, essa memória da própria família Chiappetta, que faz Leonardo voltar a gesticular efusivamente, honrando o seu sangue calabrês. "Não vamos fechar, isso você pode ter certeza, vamos superar esse caso também", diz ele, com seus olhos novamente ligeiros e atentos. "Estamos sempre inovando, pensando em novos produtos. Temos trabalhado com chefs, estamos trazendo produtos do Nordeste, trabalhando com produtores locais", ressalta. "Criamos agora um sorvete com calda de frutas como cajuí e mangaba, unindo a tradição italiana com os produtos do Nordeste. Estamos sempre nos adequando ao público que vem aqui, sempre pensando como melhorar."
A dívida que causou o pedido de recuperação judicial vem de 2002, herança da mudança brusca no câmbio. "Imagine que eles fizeram todas as encomendas com o dólar a R$ 2, venderam e aí, quando tiveram de pagar, o dólar estava a R$ 4", conta o administrador de empresas Ricardo Clemer Alves, que cuida do processo de recuperação do empório. "Isso levou a diversas cobranças, até mesmo na Justiça, que só pioram a dívida. Por isso entramos com o pedido de recuperação judicial, para sanar isso. Para um estabelecimento como esse, nada é mais importante do que o nome. Se não fizéssemos isso, a loja entraria em colapso."
Para complicar, o próprio Mercadão passou por muitas mudanças - anteriormente voltados para o abastecimento de restaurantes, os boxes tiveram de se adequar a um novo público nos últimos anos, pessoas que vão muito mais ao prédio projetado por Ramos de Azevedo pelo turismo e pelo exótico do que para as compras do dia-a-dia. Leonardo, no entanto, se recusa a usar palavras fortes como "crise" ou "colapso". "Logo a quarta geração dos Chiappettas vem aí, meu sobrinho logo assume. A história vai continuar." (Rodrigo Brancatelli - AE)
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Fonte: http://www.cruzeirodosul.inf.br (11/08/2010)