Passados dois anos do pedido de recuperação judicial, a petrolífera OGPar (ex-OGX), que já foi o carro-chefe das empresas do grupo “X”, de Eike Batista, atravessa nova grande crise financeira. A empresa não paga o aluguel de plataformas há meses, e a produção de petróleo só faz cair, por falta de recursos para incrementar a atividade. A companhia sequer tem dinheiro para arcar com as garantias exigidas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) para desativar o campo de Tubarão Azul, na Bacia de Campos, outrora apontado como o mais promissor de seu portfólio, mas que, desde setembro, não produz uma gota de petróleo.
Em meio à carência de recursos — a OGPar tinha US$ 13 milhões em caixa em 30 de junho, segundo dados do balanço financeiro — a companhia trava uma briga judicial com credores da FPSO OSX-3, plataforma que fica no campo de Tubarão Martelo, na Bacia de Campos, o único em produção, o que põe em risco seu plano de recuperação judicial.
O pedido de proteção à Justiça foi feito em 30 de outubro de 2013. Pouco depois, a então OGX acertou com um grupo que detinha a maior parte da dívida de R$ 13 bilhões converter o débito em ações da empresa. Acertou-se que eles fariam uma injeção de US$ 215 milhões, chamado DIP, com uma emissão de debêntures (títulos da dívida) da ex-OGX, que poderiam ser convertidas em ações. Na prática, eles seriam os novos donos da companhia.
LISTA: Onde estão as estrelas do grupo ‘X’?
Toda a engenharia financeira está prevista no plano de recuperação judicial. Para dar fôlego à empresa, foi acertado entre OGPar e sua empresa-irmã OSX que o valor do aluguel pela FPSO OSX-3 cairia de US$ 439 mil por dia para US$ 250 mil por dia. A OSX é dona das plataformas usadas pela petrolífera do grupo e, por isso, acabou arrastada para a recuperação judicial, em novembro de 2013, após várias encomendas canceladas. Sem ter para onde fugir, aceitou a redução das diárias.
‘CREDORES NÃO QUEREM FALIR A EMPRESA’
O problema foi a queda no preço do petróleo. Quando o plano de recuperação da OGPar foi aprovado, em junho de 2014, o barril girava em torno de US$ 100. Hoje, está na casa dos US$ 50. A OGPar passou a atrasar o pagamento do aluguel da plataforma de Tubarão Martelo, o que deixou os credores da plataforma enfurecidos. No cálculo do escritório Felsberg Advogados, que os defende, a dívida está em US$ 90 milhões e está sendo cobrada na Justiça.
A batalha judicial se tornou uma pedra no sapato de Paulo Narcélio, presidente da OGPar. Um acordo com os credores da FPSO OSX-3 é precondição para que o grupo de credores que havia injetado dinheiro na empresa converta o crédito em ações. Em fevereiro, a OGPar tinha pedido a eles prazo até 15 de agosto para solucionar o impasse. Sem consenso, o prazo havia sido prorrogado até anteontem. A OGPar afirma estar próxima de um acordo.
— Qualquer credor que entenda que as obrigações do plano não estão sendo cumpridas dentro do cronograma previsto pode pedir a falência da empresa — explica Juliana Bumachar, sócia do Bumachar Advogados Associados, especializado em recuperação judicial.
Narcélio descarta a hipótese de falência:
— Todas as partes sabem seus limites, e a falência da empresa seria ruim para todos. O que acontece é que todos os credores querem tirar vantagem da fragilidade momentânea da companhia e obter o melhor resultado das negociações. Os credores não querem falir a empresa — disse, citando como entrave a posição do sócio da OGPar na Parnaíba Gás Natural, que, segundo ele, estaria criando dificuldades para não concluir a compra da fatia da OGPar na empresa de exploração de gás.
A aposta é o bloco BS-4, na Bacia de Santos, no qual é sócia de Queiroz Galvão e Barra Energia. Nele, estão os campos Atlanta e Oliva, e o primeiro óleo é previsto para 2016. Na semana passada, a OGPar assinou contrato com a Shell para venda de sua parte da produção em Atlanta.
— Não fosse a queda do preço do óleo, a situação estaria saneada. O setor está sujeito a flutuações de preço — diz Narcélio.
Com prejuízo de R$ 320 milhões no primeiro semestre, a OGPar não tem dinheiro para arcar com as garantias exigidas pela ANP para desativar o campo de Tubarão Azul. A produção parou, mas há um custo para o abandono, incluindo medidas de segurança ambiental — o poço tem que ser selado e o equipamento, removido.
Segundo fontes, são mais de US$ 60 milhões em garantias. De acordo com a empresa, a OSX, dona da plataforma ancorada no campo, arcaria com parte dos custos. Parte do montante só seria paga à agência quando a plataforma for vendida, afirmam fontes. A ANP diz que a questão “está em análise técnica e jurídica”.
A falta de recursos afetou diretamente a produção. Em seu balanço, a OGPar diz que “o menor volume de produção (no campo de Tubarão Martelo, no segundo trimestre) foi resultado da contínua ausência de investimentos no campo devido às condições econômicas e de viabilidade financeira”. Em setembro, Tubarão Martelo produziu 9 mil barris por dia. No início do ano, eram 14 mil barris diários.
PERDA EQUIVALENTE A UMA PETROBRAS
Em outubro de 2010, quando a OGX atingiu o pico de seu valor de mercado — R$ 75,22 bilhões — prometia produção de 730 mil barris diários em 2015. Da mesma forma que as promessas de Eike viraram vento, R$ 113 bilhões em valor de mercado das cinco principais empresas do grupo evaporaram. Juntas, a então OGX, OSX, MMX, LLX (atual Prumo) e MPX (Eneva) chegaram a valer R$ 117,3 bilhões, se considerado o pico de valor de cada uma, alcançado entre 2008 e 2012. Quase uma Petrobras a valores de hoje (R$ 113 bilhões).
Hoje, elas valem R$ 5,2 bilhões. E apenas uma, a Prumo, que foi vendida à americana EIG em 2013, se safou da recuperação judicial. No primeiro semestre, teve perda de R$ 56,4 milhões. Seu principal projeto é o Porto do Açu, em São João da Barra, no Norte Fluminense, onde funciona o estaleiro da OSX. A Eneva, que passou ao controle da alemã E.ON em 2013, não conseguiu honrar créditos bancários e pediu proteção judicial em dezembro.
INFOGRÁFICO: Veja os valores das empresas
OSX e MMX Sudeste, sob controle de Eike, estão em recuperação judicial. Para a OSX, uma das dificuldades é a venda das plataformas OSX-1 e OSX-2. Sua dívida soma R$ 3,5 bilhões, dos quais R$ 2,7 bilhões foram renegociados nos termos do plano de recuperação. A curto prazo, espera receber empréstimo adicional dos credores. O plano é atuar sob coordenação da Prumo Logística na prospecção de empresas dispostas a instalar no Porto do Açu empreendimentos ligados à indústria naval.
A MMX foi a que mais avançou nas soluções. Eike vendeu o Porto Sudeste à holandesa Trafigura e ao fundo árabe Mubadala por US$ 400 milhões em 2013. Os ativos da empresa em Corumbá foram arrendados à Vetorial, restando minas em Minas Gerais, alguns terrenos e terminais de carga, reunidos na MMX Sudeste, que tem dívida sujeita à recuperação judicial de R$ 840 milhões. A Trafigura acertou a compra de duas das principais minas da MMX Sudeste por R$ 70 milhões.
— O projeto de Eike foi um fracasso. Na ex-OGX, que era a vitrine do grupo, a única coisa que deu certo foram os campos de gás no Maranhão, que hoje pertencem à Parnaíba Gás Natural. De onde menos se esperava resultado, foi de onde mais vieram frutos — afirma Pedro Zalán, da ZAG Consultoria em Exploração de Petróleo.
Em entrevista ao GLOBO em setembro de 2014, Eike disse que seu patrimônio líquido era negativo em US$ 1 bilhão. Em 2011, quando era o 7º mais rico do mundo na lista da “Forbes”, sua fortuna era avaliada em US$ 30 bilhões. Ele continua a prospectar negócios em viagens ao exterior — pretende se aventurar no ramo de sequestro de carbono — e se prepara para enfrentar a retomada de julgamentos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Está marcado para o dia 10 o julgamento de processo em que é acusado de aprovar as contas da OGPar em benefício próprio, originário de queixa do acionista minoritário Marcio Lobo, que reconhece que este caso tem menos peso entre os oito processos em que Eike é investigado.
— Os dois processos que deram origem à investigação na Justiça ainda não foram julgados — diz Lobo.
A CVM diz que eles estão em análise.