A NII Holdings, dona da Nextel, deu um importante passo ontem para sua reestruturação ao registrar um pedido voluntário de recuperação judicial no tribunal de falências de Nova York. A empresa sediada em Reston, Virgínia, está renegociando com cerca de cem credores US$ 4,35 bilhões de uma dívida total de US$ 6 bilhões.
Os débitos das subsidiárias do Brasil, México e Argentina não entram nessa renegociação. Além disso, no fim desse processo, o Brasil será beneficiado com mais investimentos do grupo, disse o presidente da subsidiária local, Gokul Hemmady, em entrevista exclusiva ao Valor. O executivo não revelou números, mas fontes estimam que o montante poderá atingir R$ 1,1 bilhão em 2015, de acordo com as negociações em curso com os credores, ante R$ 500 milhões que estão sendo aplicados neste ano.
A maior parte da dívida em negociação está concentrada em dez credores, que representam cerca de 60% do débito. O maior credor é o The Capital Research Group, seguido pelo Aurelius Capital. Mas empresas como Vanguard e Fidelity também contam com participações relevantes. O plano da NII é converter o débito em ações da empresa, o que tem obtido receptividade favorável dos credores, que se tornarão acionistas da NII.
É difícil estimar quanto cada credor terá de participação na empresa depois de reestruturada. A estrutura de débitos que eles possuem é considerada complexa e possivelmente não representa hoje as posições futuras que possam ter em ações, já que os tipos de dívidas que controlam são diferentes. Além disso, está ocorrendo uma disputa entre os principais credores por maiores fatias na empresa.
Com a divulgação do plano da NII de converter os credores em acionistas, cresceu a negociação de compra de dívida no mercado. O Capital Resourch já havia comprado cerca de US$ 1 bilhão em dívida de pequenos investidores desde março, quando a NII contratou os bancos UBS e Rothschild para negociar com os credores.
A NII começou a conversar com os credores há meses, pois pretendia demonstrar seu plano de reestruturação e obter mais de dois terços de adesões antes de formalizar o pedido de recuperação judicial. Com a concordância da maioria, mesmo informal, o acordo diante do juiz será mais fácil. A expectativa é que os minoritários que tendem a não aceitar a conversão do débito em ações sejam convencidos pelo juiz de que essa é a melhor saída para todos.
Paralelamente, a NII negocia a venda da Nextel Argentina. Conforme o Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, antecipou em agosto, o provável comprador é o grupo Fucata, do Uruguai. O valor não foi revelado, mas estima-se que se situe em cerca de US$ 200 milhões.
O Fucata é composto pelo Grupo Veintitrés, Optimum Advisors e ISM Capital, e firmou acordo em agosto para aquisição da Nextel Chile. A unidade do Peru já havia sido vendida em 2013 para a Empresa Nacional de Telecomunicaciones e uma de suas subsidiárias, a Entel.
A subsidiária da Argentina não tem rede de terceira geração (3G) instalada, só opera com a tecnologia de radiochamada, iDEN, com 1,9 milhão de clientes. No segundo trimestre perdeu mais de 20 mil assinantes. A receita média por usuário caiu 37,5%, para US$ 15 na comparação anual. A receita operacional da empresa atingiu US$ 108,1 milhões no segundo trimestre do ano, 34,08% menor que em igual período de 2013. No semestre, alcançou 220,8 milhões, com recuo de 33,29%.
Ao começar a colocar a casa em ordem, a NII mostra também que precisou encolher para sobreviver. Vendeu subsidiárias e vai abrir mão do controle total para dividir a empresa com novos sócios. Nesse processo está prevista a emissão de novas ações. Por outro lado, elimina a maior parte de sua dívida, ganha liquidez e deve retomar o caminho do crescimento.
A receita do grupo, que atingiu US$ 6,38 bilhões em 2011, vem em declínio desde então e ficou em US$ 4,77 bilhões em 2013.
Nessa nova fase do grupo, as unidades do Brasil e México saem em vantagem. Responsáveis por 87% das receitas totais da NII, agora serão alvo de todas as atenções. Da dívida total, o Brasil detém cerca de US$ 1 bilhão contraído junto ao Banco do Brasil, à Caixa Econômica Federal e ao banco de desenvolvimento econômico e social da China. A dívida da unidade do México é de aproximadamente US$ 650 milhões. Nos dois casos não haverá renegociação e o cronograma de pagamentos de longo prazo segue inalterado.
Hemmady está animado com o papel que o Brasil terá no grupo daqui para frente. Depois de eliminar a maior parte de sua dívida, a NII deverá focar suas atenções no Brasil e México. E livre da dívida que vinha consumindo seus recursos com pagamento de juros e serviços, o grupo poderá reforçar os investimentos nas duas subsidiárias. Até recentemente, o serviço da dívida envolvia US$ 500 milhões por ano.
Hemmady disse que a subsidiária não faz remessas de lucros para a controladora há uns dois ou três anos. Ao contrário, afirmou que há dois meses a unidade vem recebendo aportes do grupo porque está em processo de investimentos. Não revelou os valores, mas disse que é preciso expandir a rede para a tecnologia LTE, de quarta geração (4G). "Queremos comprar espectro para São Paulo e construir a rede LTE, como fizemos no Rio", disse.
Nos primeiros dois meses de lançamento da rede 4G no Rio de Janeiro, a empresa conquistou 70 mil clientes. A base de 3G e 4G soma mais de 1,2 milhão de assinantes. A expansão de 4G para São Paulo tem algumas opções que estão atreladas à disponibilidade de espectro. Em 3G, o plano é aumentar a capilaridade em todo o país.
No Rio, a Nextel lançou 4G na faixa de 1,8 gigahertz. A empresa também tem 800 megahertz, atualmente ocupada pela tecnologia iDEN, de radiochamada. Esses clientes estão migrando para 3G, mas a ocupação futura com 4G depende de autorização da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). O processo está um pouco complicado porque os competidores exigem que a Nextel pague novamente a licença para usar em 4G. Hemmady discorda e a questão segue em consulta pública. O leilão de 700 MHz, marcado para 30 de setembro está sob análise, mas o executivo considera mais difícil a participação da empresa.
Como diretor de operações da NII Holdings, Hemmady residia nos EUA até 2012, quando acumulou interinamente a chefia da Nextel Brasil. No ano passado foi oficializado no cargo e passou a morar em São Paulo. Agora, planeja elevar a base de clientes para 8 milhões em três anos.