Em meio ao ambiente de fraca atividade econômica e rápida deterioração das operações das companhias, as restrições nos mercados de dívida corporativa e crédito bancário têm sido o fator determinante para levar empresas à recuperação judicial. A expectativa é que cada vez mais instituições bem administradas e com números historicamente saudáveis entrem nesse processo.
Em outubro, a Officer pediu a recuperação judicial após a tentativa frustrada de reestruturar seus passivos. Controlada pela Ideiasnet, a maior distribuidora de produtos de informática do país tinha endividamento líquido de R$ 148,3 milhões no fim do primeiro semestre. A controladora destaca, entre os motivos que levaram a distribuidora a pedir a recuperação, as dificuldades de obter condições razoáveis de financiamento.
Outro exemplo de empresa que foi recentemente para a recuperação devido às dificuldades de renegociação de dívida e de obter dinheiro novo é o grupo Dadalto, um dos principais varejistas do Espírito Santo - que controla lojas de departamento e a rede D&D, de material de construção. A companhia contraiu dívida cara no passado para financiar sua expansão, iniciada há três anos, e começou a enfrentar dificuldades com a piora da economia.
"Observamos forte movimento de renegociação de dívida, mas a tendência é aumentar cada vez mais o número de companhias bem administradas, que tinham boas margens, e caminham para a recuperação. As empresas médias são as mais afetadas pela escassez do crédito e encarecimento da dívida", afirma Tiago Lopes, sócio da área de insolvência e reestruturação do escritório Souza, Cescon, Barrieu & Flesch Advogados.
Segundo Lopes, os bancos médios davam dinamismo para o "middle market", mas com a crise o dinheiro secou e as instituições passaram a trabalhar com empréstimos de prazos mais curtos e juros mais altos. Além disso, empresas menores e com rating pior não conseguem acessar o mercado de capitais para emitir nova dívida.
O setor de açúcar e álcool é o que mais tem registrado pedidos de recuperação e um dos casos mais recentes, que engrossou a lista do segmento, foi da Tonon Bioenergia. Com quase R$ 3 bilhões em passivos, a empresa renegociou condições dos bônus e recebeu até dinheiro novo. Mas a forte valorização do dólar no segundo semestre deteriorou sua já difícil situação financeira. Assim como outros casos no setor, a empresa aproveitou uma onda de captações externas, mas com juros considerados elevados para o baixo retorno da atividade.
A Tonon seguiu o caminho da sucroalcooleira Aralco, que pediu recuperação judicial em abril de 2014, menos de um ano após emitir bônus de US$ 250 milhões para alongar dívidas. Outro caso é do grupo Virgolino de Oliveira, em recuperação extra-judicial, que também se financiou no passado com captações no exterior.
"As empresas foram se debilitando ao longo do ano passado e 2016 deve ser bem pesado, com muitos pedidos de recuperação. A combinação de juros altos, recessão e falta de confiança está prejudicando muitas empresas até então sólidas e bem organizadas", afirma Thomas Felsberg, sócio do escritório Felsberg Advogados.
As companhias sem muita exposição operacional no exterior e com dívida em dólar estão pagando caro pelo passivo por conta da variação da moeda. Em 2015, o dólar comercial teve alta de 48,75%. Quem tem caixa disponível recompra os ativos para aliviar o balanço. Dentro do país os títulos também estão mais caros, com a alta da Selic, que passou de 11,75% em 2014 para 14,25% no fim do ano passado.
Conforme explica o executivo de um banco de investimentos que preferiu não se identificar, empresas se alavancaram no passado para financiar investimentos. Ao longo do ano passado, a dívida ficou muito cara e os resultados operacionais estão em queda livre, o que causa descasamento nos balanços das empresas. Sem acesso ao dinheiro novo, a recuperação acaba sendo a única saída.