Por diversas razões, a distribuição de uma recuperação judicial pela empresa em crise econômico-financeira ainda tem uma conotação negativa no Brasil. Levará tempo para que nossa cultura a compreenda integralmente e aceite como ferramenta para recuperar empresas viáveis, como parte do ciclo de vida das empresas, minimizando os custos sociais.
Em geral, a crise de credibilidade é o primeiro sintoma da recuperação judicial. Como conseqüência o devedor usualmente experimenta imediata restrição de crédito. Termos e condições para continuidade das operações são tipicamente revistos: quem vendia a prazo passa a vender à vista ou mediante pagamento antecipado.
Nesse cenário é essencial que a empresa em crise tenha mecanismos eficientes para obter novos financiamentos visando assegurar a continuidade de suas atividades enquanto reestrutura suas obrigações e operações. No exterior, ao menos antes da recente crise global e restrição da oferta de crédito, quando uma empresa dava início a um processo de recuperação judicial havia imediata oferta de crédito.
No Brasil sempre foi difícil para empresas em crise obterem novos recursos, especialmente em razão da falta de proteção legal para os novos financiadores. Buscando mudar essa realidade, a Lei de Falências e Recuperação de Empresas – LFR (Lei. No. 11.101/05), inovou ao estabelecer dispositivos que deveriam ser satisfatórios para estimular o financiamento de empresas em recuperação judicial.
Ocorre que a ausência de (outras) normas regulatórias que incentivem, ou ao menos não criem embaraços, a que instituições financeiras concedam dinheiro novo, somada a certos privilégios e prioridades conferidos pela mesma legislação falimentar a determinados tipos de operações financeiras, têm se revelado obstáculos comuns para que a empresa em recuperação obtenha novos recursos.
Nos quase 5 anos de vigência da LFR, a realidade é que ainda existem muitos poucos casos em que o devedor conseguiu obter recursos após distribuir sua recuperação judicial. Recentemente um dos maiores Grupos brasileiros de industrialização e comercialização de carne bovina foi bem sucedido ao realizar uma emissão de títulos no exterior, em colocação privada, com valor superior a US$ 150 milhões, integralmente garantidos por ativos de sua propriedade.
A operação estava prevista no seu plano de recuperação judicial aprovado e era necessária para estabilizar o capital de giro da empresa, além de viabilizar certos pagamentos previstos no plano. Inédita no mercado doméstico e pouco usual mesmo no mercado internacional, a consumação dessa operação reforça o interesse e as boas oportunidades para investidores dispostos a emprestar recursos a empresas em crise no Brasil.
Contudo, os poucos casos de sucesso também sugerem que o oportuno aprimoramento das regras para estimular a concessão desse tipo de crédito será essencial para o contínuo e efetivo desenvolvimento da atividade de recuperação de empresas no Brasil.
Autores: Luiz Fernando Valente de Paiva e Giuliano Colombo, associados fundadores da TMA Brasil e respectivamente sócio e associado sênior da área de recuperação de empresas do escritório Pinheiro Neto Advogados.
Fonte: www.brasileconomico.com.br (11/05/2010)