Morosidade do Judiciário afasta investidores interessados em empresas em recuperação judicial, diz Moratelli, da Orey
Empresas quebradas ou a caminho da falência têm atraído gestores de recursos especializados em reestruturação de companhias. Nomes nacionais como Corporate Consulting, Arion Capital, Orey Financial e DX3 Investimentos, competem nessa nova frente de negócios com grupos estrangeiros, como o The Global Emerging Markets Group (Gem), com sedes nos Estados Unidos e no Reino Unido.
Só nos últimos 12 meses encerrados em fevereiro, o número de pedidos de recuperação judicial de empresas brasileiras cresceu 29%, somando 595 casos e abrindo oportunidades de investimento para essas instituições.
Diferentemente dos investidores que compram carteiras de crédito podre, esses gestores não só assumem o passivo das empresas, como buscam reestruturar a gestão e promover o refinanciamento das dívidas.
Depois de atuar por anos na consultoria para empresas em dificuldade financeira, a Corporate Consulting acaba de levantar um fundo de R$ 20 milhões para comprar participações em companhias endividadas. Os recursos devem vir da emissão de debêntures pelo fundo.
O primeiro investimento foi na engarrafadora de água mineral Lindoyana e há mais duas metalúrgicas em análise, a Monte Castelo, em Erechim (RS), que está em recuperação judicial, e outra no Paraná. "O setor metalúrgico passa por um momento difícil. Enfrenta a concorrência com o aço importado e ainda apresenta aumento da capacidade ociosa", afirma Luis Alberto de Paiva, presidente da Corporate Consulting. O executivo também vê oportunidades em setores de bens de consumo e alimentício. O foco são companhias de médio porte com R$ 50 milhões a R$ 200 milhões de faturamento.
A Orey Financial tem investido em companhias que tiveram a falência decretada e agora busca empresas em recuperação judicial. A gestora está levantando R$ 50 milhões com investidores estrangeiros. Em um primeiro momento serão captados R$ 25 milhões por meio de um fundo de participação e R$ 25 milhões com a emissão de dívida pela Sociedade de Propósito Específico (SPE) criada para investir em cada companhia. A ideia é fazer uma chamada de capital para cada investimento. "O apetite dos investidores brasileiros ainda é muito pequeno para ativos de maior risco", afirma Rodrigo Moratelli, diretor da Orey, que participou da reestruturação da dívida da Teka e da Gradiente.
Num dos primeiros desinvestimentos, na recuperação de uma empresa do setor petroquímico, a gestora conseguiu multiplicar por três o capital investido de R$ 12 milhões. Há mais duas empresas no radar: uma fábrica de eletrônicos em Manaus, em processo de falência com uma dívida de R$ 450 milhões, e outra do segmento de plástico, que conta com um portfólio imobiliário com valor potencial estimado em R$ 350 milhões. "Pretendemos promover uma mudança de gestão na empresa do segmento de plásticos com a troca do presidente e diretor financeiro", diz Moratelli.
Outra casa que está de olho em empresas endividadas é a DX3 Investimentos. A instituição já investiu diretamente em 15 companhias, algumas em recuperação judicial, e está analisando mais cinco ou seis investimentos.
Entre as companhias que receberam os recursos estão a grife carioca Flor, a Savoy, de autopeças, e a empresa de engenharia Seebla, fornecedora da Petrobras. Essa última está em vias de entrar em recuperação judicial, com uma dívida de R$ 80 milhões, superior ao contrato de R$ 70 milhões de prestação de serviço com a estatal de petróleo. A gestora ainda reúne no portfólio três empresas que fazem parte de uma holding do segmento de plásticos, duas delas em recuperação judicial.
O esforço para enxugar os custos e alavancar as receitas tem dado resultado. A DX3 conseguiu aumentar o faturamento da DS Construtora de R$ 2 milhões para R$ 7 milhões em dois anos, obtendo um lucro de 650% sobre o capital investido de R$ 2 milhões, conta Crezo Suerdieck Dourado, presidente da gestora.
Há mais tempo no mercado, a Arion Capital também tem investido nesse segmento e teve como sócio o espanhol Henrique Bañuelos na Maeda, do setor de agronegócio. A Arion saiu da empresa com a fusão com a Brasil Ecodiesel e entregou a participação do fundo para Bañuelos, que continua sócio da Vanguarda Agro.
Na Maeda, o fundo Arion reestruturou a dívida e vendeu alguns ativos para capitalizar a empresa. "Investimos R$ 90 milhões na Maeda [na compra de 86% da empresa] e vendemos por R$ 300 milhões", diz Renato Carvalho, sócio da Arion.
O executivo ainda vê oportunidade de consolidação no setor de agronegócio, principalmente no segmento de açúcar e álcool. "O que procuramos são bons ativos, com estrutura de escala ou de capital ruins, em que podemos criar valor", diz Carvalho, da Arion.
Já a Gem, depois de encerrar uma parceria com o Banco Pine no Brasil, continua investindo em empresas em dificuldade financeira, e, neste ano, acertou um aporte de R$ 65 milhões na Tecnosolo Engenharia. A gestora ainda comprometeu uma alocação de até R$ 110 milhões em ações da Teka, que será desembolsada no prazo de até três anos, e concedeu uma linha de crédito de R$ 130 milhões para a Agrenco, tendo investido R$ 126 milhões na Laep em 2010.
Paiva, da Corporate Consulting, destaca que as companhias em recuperação judicial enfrentam dificuldade para conseguir crédito bancário para financiar o capital de giro e que esses fundos são uma opção para recapitalizá-las.
A maior dificuldade na recuperação dos passivos, segundo os gestores, é que a legislação brasileira não favorece muito o investidor, privilegiando as dívidas trabalhistas e tributárias. "Quanto menor a exposição da empresa a dívida trabalhista, melhor", diz Paiva.
Já o diretor da Orey destaca que o maior problema que afasta os investidores é a morosidade do Judiciário no julgamento dos processos. Para reduzir o risco dessas operações, a Orey só investe em companhias que tenham ativos reais como garantia. A empresa do setor petroquímico em processo de falência, por exemplo, tinha uma dívida de R$ 240 milhões, mas reunia uma carteira de ações da Petrobras, além de um portfólio de imóveis, que podem ser usados para levantar recursos para pagar os credores.
A gestora também chegou a emitir "junk bonds" no exterior, títulos considerados de alto risco, para pagar os credores. A emissão foi feita por meio da SPE criada para realizar o investimento e os papéis eram atrelados à liberação do pagamento de uma dívida de precatório detida por uma empresa de engenharia em processo de falência no valor de R$ 500 milhões.
Autor: Silvia Rosa
Fonte: http://www.valor.com.br (23/03/2012)