Depois de os fundos de private equity terem investidos bilhões no Brasil nos últimos anos para comprar empresas que tirariam proveito do crescimento econômico, começa a surgir na indústria uma nova safra de produtos voltados para a aquisição de companhias em crise financeira.
Pelo menos três gestoras - Starboard Reestructuring Partners, IG4 Capital e Laplace Finanças - estão em processo de captação de fundos que podem investir quase R$ 2 bilhões na compra de ações e dívidas de empresas alavancadas, que estejam à beira ou já em processo de recuperação judicial - características que costumam apavorar investidores mais tradicionais.
"As gestoras de private equity sempre focaram na tese de crescimento do país, só que existem ciclos de crise", diz Paulo Mattos, fundador da gestora IG4 Capital e egresso da GP Investments, que deu início à captação de um fundo de investimento em participações de cerca de US$ 450 milhões com foco em ativos com a estrutura de capital em estresse.
No radar da IG4 estão áreas que vão do setor imobiliário ao de cimento, passando por fábricas de estruturas metálicas e infraestrutura. O exemplo que Mattos usa para explicar essa estratégia é a compra feita em julho pela IG4 do controle da então CAB Ambiental - que já era analisada por Mattos na antiga casa. A empresa passou a ser chamada de Iguá Saneamento depois de deixar de ser controlada pela Galvão Participações.
Para isso, a gestora montou um fundo com o propósito específico de investir na companhia de saneamento com R$ 410 milhões geridos pela IG4 - entre a participação do antigo controlador, que foi diluído, dinheiro de novos investidores e uma dívida adquirida do Bradesco e convertida em ações.
Em muitos casos, a entrada desses fundos na companhia se dá via aquisição de dívidas não pagas, que numa segunda etapa são transformadas em ações das companhias. Por isso, antes de fechar qualquer investimento, os gestores buscam chegar a um acordo com os credores - bancos e fornecedores, em geral. É a partir dessa negociação que já se define boa parte do retorno que o fundo terá no investimento. Com as finanças do ativo reestruturada, os gestores procuram um comprador para a empresa.
Criada no início deste ano por Fabio Vassel, a Starboard deu início à captação de um fundo de investimento em participações de US$ 200 milhões, com o objetivo de comprar empresas endividadas ou títulos de dívida delas.
Antes de fundar a Starboard, Vassel liderava a área de reestruturação de empresas da gestora Brasil Plural. Na antiga casa, o executivo já tinha investido, por exemplo, nas empresas Inepar, de equipamentos, na mineração Caraíba e na varejista Camisaria Colombo com recursos de um fundo de R$ 125 milhões.
Na Starboard, às vezes a entrada como investidora se dá após um período de prestação de serviço de assessoria financeira para a reestruturação. Isso, porém, não é um pré-requisito para os investimentos. Em julho, a companhia assumiu o processo de recuperação judicial da UTC, mas sem se tornar sócia da empresa.
Segundo Vassel, presidente da Starboard, estão no radar da gestora companhias que tenham uma dívida financeira em torno de R$ 1 bilhão. "São empresas que já têm algum nível de compliance", diz o executivo.
Para o gestor, passados dois anos de recessão, tornou-se mais fácil filtrar quais companhias podem ser alvo de investimentos. "Temos o benefício de olhar o comportamento delas nos últimos anos num período de estresse." Se a economia voltar a crescer, Vassel diz que a Starboard pode tirar proveito de crises em setores econômicos específicos.
A Laplace Capital, de Renato Carvalho, Allan Libman e Marcelo Saad, também está concluindo a captação de um fundo voltado para ativos de empresas em crise financeira, segundo o Valor apurou. Procurada pela reportagem, a consultoria especializada em reestruturação de empresas disse que não comentaria o assunto no momento. Atualmente, a Laplace é assessora financeira da operadora de telefonia Oi na recuperação judicial.
Essas gestoras tentam explorar um mercado já consolidado globalmente, com participantes com foco nas chamadas "situações especiais", como a Oaktree Capital Management e a Cerberus Capital Management.
A Cerberus, que tem mais de US$ 30 bilhões sob gestão tem uma parceria com a IG4, que lhe dá o direito de analisar em primeiro lugar os investimentos que a IG4 pretende fazer para decidir se quer participar do aporte de forma conjunta.
Na Starboard, a associação é com a Blakhill Partners, banco de investimento especializado em reestruturação complexas
10/08/2017