Frigoríficos: Relatório da Moody's aponta evolução dos indicadores financeiros com melhora do cenário, mas prevê aperto de margens em carne bovina.
A situação de liquidez da maioria das companhias de carnes brasileiras melhorou com a retomada da oferta e dos custos do crédito aos níveis pré-crise financeira global. Esse avanço nos indicadores se deu graças às recentes ofertas de ações e de dívidas no mercado, conclui relatório da Moody's Investors Service, que faz uma análise comparativa dos ratings de crédito de cinco empresas brasileiras: BRF-Brasil Foods, JBS, Marfrig, Minerva e Independência.
Mas o setor - que viveu uma forte consolidação no último ano também em decorrência dos problemas financeiros - ainda deve enfrentar dificuldades, sobretudo as empresas com foco na produção de carne bovina.
De acordo com a Moody's, o setor ainda sofre os efeitos da sobrecapacidade causada por investimentos elevados em plantas de abate de bovinos antes da crise e pelo fato de unidades terem deixado de operar já que várias empresas entraram em recuperação judicial. Parte dessas unidades foi arrendada por empresas como JBS e Marfrig.
"As margens devem voltar a ser pressionadas porque há capacidade ociosa e um gargalo na oferta de gado para abate", disse Soummo Mukherjee, analista sênior da Moody's Investors Service. Ele afirma que o rebanho está se recompondo, mas não no ritmo esperado. Assim, se as empresas quiserem utilizar melhor sua capacidade "haverá disputa pelo gado". O Minerva utiliza hoje 83% de sua capacidade, mas JBS e Marfrig trabalham em níveis mais baixos, de 71% e 58%, respectivamente.
Mas se a capacidade ociosa preocupa, o mercado externo dá sinais de retomada. Ainda que lenta, a recuperação da economia mundial está sustentando as vendas e os preços da carne bovina no exterior. Conforme a Moody's, o setor pode se beneficiar com as maiores exportações para a União Europeia - que está flexibilizando as regras para o produto brasileiro - e com a recuperação gradual das vendas para a Rússia. Há ainda expectativa de que a China eleve as importações, hoje marginais.
O relatório da Moody's traz ainda análise comparativa dos ratings de crédito das cinco empresas em questão e elenca os fatores considerados na hora de conceder a nota às empresas do setor. Além da liquidez em um cenário de estresse - que tem um peso de 11,25% no rating- , a Moody's avalia o tamanho, escala e diversificação; marca e potencial de crescimento; volatilidade dos ganhos; política e medidas financeiras.
A agência de rating observa que as empresas de carnes conseguiram se beneficiar das melhores condições de liquidez. Exemplos disso foram as captações com ações de R$ 5,2 bilhões da BRF, de R$ 1,4 bilhão da Marfrig e de R$ 161 milhões do Minerva no ano passado. Já a JBS conseguiu levantar R$ 3,5 bilhões com as debêntures conversíveis compradas pelo BNDES, depois de incorporar a Bertin e adquirir o controle da americana Pilgrim's Pride. A empresa também está tentando obter entre R$ 1,7 bilhão e R$ 2,3 bilhões com uma nova oferta de ações.
A BRF levantou ainda US$ 750 milhões com emissão de notas e o Minerva, US$ 250 milhões. Até o Independência, em recuperação judicial, obteve US$ 165 milhões em bônus no mercado externo.
Outro fator considerado no setor de carnes é o tamanho, escala e diversificação de produtos e geográfica das empresas, com um peso de 22,5% no rating, conforme a metodologia da Moody's. Segundo o relatório, companhias com mais escala geralmente têm custos menores e posicionamento forte em relação aos consumidores. Além disso, têm mais opções de financiamento, como o mercado de capitais ou injeções de recursos do BNDES. O BNDESPar é acionista estratégico da JBS (23% do capital), Marfrig (11,6%) e também no Independência (22%).
Com Pilgrim's e Bertin, a receita líquida pro forma da JBS em 2009 foi de US$ 27,6 bilhões, à frente da americana Tyson (US$ 26,7 bilhões). A BRF, resultado da união entre Perdigão e Sadia, teve receita líquida pro forma de R$ 24,4 bilhoes, quase o dobro da antiga Perdigão. No caso da Marfrig, a receita pro forma foi de cerca de R$ 12,6 bilhões após a aquisição da Seara. A Moody's observa que no caso de Marfrig e JBS considerou-se ainda que as duas companhias cresceram agressivamente por meio de várias aquisições recentes. Dessa forma, há um histórico limitado das operações pós-aquisições que possam refletir numa melhoria do perfil de crédito da companhia.
No que diz respeito à diversificação de segmento, esta pode reduzir o impacto de variações na demanda. Já a diversificação geográfica reduz riscos com problemas sanitários, por exemplo.
Outros fatores considerados pela Moody's são a marca e o potencial de crescimento, com um peso de 11,25% no rating. A JBS está na frente no quesito participação de mercado, já que é a maior produtora e exportadora de carne bovina do mundo. Mas Marfrig e BRF também melhoraram seus percentuais após as recentes aquisições.
No quesito marca e valor agregado, a Moody's destaca a BRF, que tem 46,5% de suas receitas provenientes de produtos processados - uma das razões para ter o maior rating do segmento (Ba1). Ainda que venha investindo na agregação de valor, a Marfrig precisará de algum tempo para ter marcas tão atrativas quanto as da BRF no mercado, observa o relatório.
A volatilidade dos ganhos tem peso de 7,5% no rating da Moody's. É um ponto importante quando se avalia as empresa do setor de alimentos, que estão sujeitas à oscilação de custos de insumos, de vendas, lucros e fluxo de caixa. Os ganhos dessas empresas também sofrem o impacto das flutuações do câmbio, já que são exportadoras.
Os fatores de maior peso nos ratings das empresas são estratégia financeira e indicadores de liquidez - com 47,5%. Em sua avaliação, a Moody's foca a estabilidade dos indicadores de crédito, apetite por aquisições e abordagem em relação ao retornos para o investidor. Para a agência, a BRF tem as metas financeiras de longo prazo mais claramente definidas do segmento. JBS e Marfrig são considerados mais fracos nesse critério por sua inclinação para crescer por meio de aquisições.
Autor: Alda do Amaral Rocha
Fonte: Valor Econômico (22/04/2010)