Diante da alta de pedidos de recuperação judicial, entendimento sobre sucessão dos passivos ainda gera divergências
Preocupação sobre quem é o responsável por passivos oriundos de casos de corrupção surgiu após a criação da lei 12.846, que trata desse tipo de crime
Os quatro primeiros meses de 2016 registraram recorde de pedidos de recuperação judicial, dispositivo em que a empresa recorre à Justiça para aprovar planos de pagamento de suas dívidas. Nesse contexto, a preocupação acerca da responsabilidade sobre passivos da empresa em débito volta a rondar o mercado.
Até 2013, não havia dúvidas. De acordo com o texto da Nova Lei de Falências, em vigor desde junho de 2005, quem comprava uma companhia ou parte dela estava isento de suas penalidades. A situação ficou mais nebulosa, no entanto, a partir da criação da Lei Anticorrupção (12.846/2013).
Os primeiros questionamentos nos escritórios de advocacia surgiram ainda no ano passado, quando os primeiros ativos de companhias investigadas pela Operação Lava Jato começaram a ser vendidos. Algumas dessas empresas já anunciaram a decisão de pedir recuperação judicial.
“A lei diz expressamente que há sucessão dos passivos”, diz Ricardo Gaillard, sócio da área Compliance e Anticorrupção do escritório Souza, Cescon, Barrieu & Flesch Advogados. De acordo com o especialista, o comprador arca com o pagamento da multa, mas outras punições não são herdadas, como a proibição de prestar serviços para órgãos do poder público.
“O conceito que está por trás disso é impedir que o mecanismo da lei seja usado para que se façam fusões e aquisições que deixem para traz um passivo sem cumprir com as obrigações legais”, explica Gaillard.
De acordo com ele, o imbróglio ainda não tem uma resposta. Aqui no Brasil não há caso anterior que possa gerar precedente. Por outro lado, uma possível resposta pode estar no exterior. Nos Estados Unidos, a Justiça deixou de multar compradores que aplicaram auditorias antes da aquisição, mas não encontraram falhas.
ENDIVIDADAS. Segundo a Serasa Experian, de janeiro a abril deste ano, os pedidos de recuperação judicial feitos à Justiça dobraram em comparação a 2015: foram 571 ocorrências. Para Luiz Rabi, economista da Serasa, o aprofundamento da crise ajudou a acelerar a alta. “Outra razão é a elevação dos juros cobrados pelos bancos, assim como o maior rigor nos empréstimos”, disse.
Solução problemática. Para além das dúvidas do mercado, a recuperação judicial é alvo de críticas quando usada como solução para sanar o endividamento das companhias. “Não é a única saída e nem deveria ser a primeira”, afirma o sócio da área de Recuperação Judicial do Veirano Advogados, Ricardo Gama.
O advogado defende que o ideal é evitar o processo, que pode ser lento e dispendioso. “Há boas alternativas como a renegociação e a recuperação extrajudicial.” A segunda opção, ainda recente, pode ser bastante efetiva. A companhia deve aprovar seu plano com três quintos dos credores. Caso o juiz aprove, a proposta é homologada em até 30 dias.
Mas, caso a recuperação judicial seja o único caminho, Gama alerta que a empresa deve estar com o caixa robusto. “As linhas tradicionais de crédito cessam e as dívidas feitas posteriormente ao processo judicial seguem normalmente.”
Autor(a)
Raquel Brandão