O primeiro Código de Processo Civil (CPC) concebido no Estado Democrático de Direito e instituído pela Lei nº 13.105, de 2015, além de reiterar os princípios constitucionais que regem o processo, prevê expressamente no seu artigo 6º o dever de cooperação de todos os sujeitos do processo como o meio eficaz de se obter, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
Em decorrência do dever de cooperação de todos os envolvidos no processo e objetivando prestigiar de forma mais evidente a autonomia privada, o novo Código de Processo Civil estabelece, nas hipóteses que admitam a autocomposição, a possibilidade de flexibilização procedimental.
Assim, as partes plenamente capazes estão autorizadas a estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.
É possível convencionar que o trâmite do processo seja mais curto e a composição do conflito seja obtida num menor espaço de tempo
Não havendo previsão específica sobre a forma pela qual é possível estabelecer o negócio jurídico processual, nomenclatura adotada no meio jurídico, o instrumento particular é hábil para tal finalidade, nada impedindo que as regras procedimentais estejam insertas, inclusive, nos contratos sociais.
Evidentemente que o negócio jurídico processual celebrado anteriormente pelas partes passará pelo crivo do Judiciário e para que seja considerado válido deverá ser firmado sem vício na manifestação da vontade, em ambiente de boa-fé e de igualdade substancial das partes envolvidas.
Apesar da norma processual não exigir capacidade postulatória para o aperfeiçoamento do negócio jurídico processual, a presença de um advogado é fundamental pela sua natureza e conteúdo e as empresas estão se adaptando para usufruir as vantagens dessa novidade.
A possibilidade de se estabelecer as regras aplicáveis à eventual produção das provas no momento em que as partes discutem as cláusulas contratuais, e, portanto, estão mais acessíveis para se sujeitarem às recíprocas concessões porque ainda não estão em litígio, é extremamente salutar para que haja uma simplificação significativa da fase probatória do processo com evidente economia de tempo.
Isso porque é possível convencionar a produção extrajudicial da prova com a indicação conjunta de perito de confiança das partes e com conhecimento técnico especializado de acordo com a natureza da causa, o que resultará na qualidade e celeridade da prova porque não será necessário depender da perícia judicial que se arrasta por anos.
As partes podem estabelecer que a oitiva de testemunhas ou da própria parte seja realizada perante os advogados e documentada por notário, o que evita a designação de diversas audiências durante o trâmite processual.
Da mesma forma, é possível convencionar que o trâmite do processo seja mais curto e a composição do conflito seja obtida num menor espaço de tempo ao suprimir a utilização de recursos, prestigiando a decisão do juiz de primeira instância.
Por outro lado, há como se atribuir eficácia imediata à sentença ao se estabelecer que a apelação não tenha efeito suspensivo, o que propicia à parte obter o direito material almejado de forma efetiva e célere.
Evidentemente que o juiz controlará a validade das convenções firmadas pelas partes, mas somente poderá recusá-las quando houver nulidade, inserção abusiva em contrato de adesão ou se verificar que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.
Portanto, em se tratando de contrato livre de nulidade e firmado entre duas empresas que estejam em paridade de condições, em prestígio à autonomia da vontade, a flexibilização do procedimento será aceito e implementado pelo Judiciário, que também será beneficiado com o menor dispêndio de atos processuais a serem praticados pela máquina judiciária.
As partes e o juiz, de comum acordo, podem, ainda, fixar um calendário processual para a prática dos atos processuais, ao qual ficarão vinculados e somente será alterado em casos excepcionais, devidamente justificados.
Essa novidade também é capaz de acelerar o trâmite processual porque as partes ficam dispensadas de intimação para a prática do ato processual ou para a realização de audiência que já estejam designados no calendário.
Em razão dessas inovações trazidas pelo novo Código de Processo Civil, as empresas estão se mobilizando para inserir em seus contratos o negócio jurídico processual que será um importante instrumento de efetividade e celeridade em eventual processo judicial.
Luciana Nini Manente é doutora em direito pela PUC-SP e advogada associada à área tributária do escritório Loeser e Portela Advogados
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