Muito embora a legislação pátria tivesse sido alterada há quase dez anos para instituir a nova Lei de Falências e Recuperações Judiciais e alterar o Código Tributário Nacional (CTN), com previsões explícitas sobre a edição de lei específica de parcelamento de tributos para empresas em recuperação judicial, apenas agora em 2014 é que tal programa de parcelamento especial foi instituído na esfera federal.
Nos termos da Lei nº 13.043, de 2014, empresas em recuperação judicial poderão parcelar as dívidas fiscais federais em 84 (oitenta e quatro) meses, ou seja, sete anos. O valor das parcelas é aumentado ao longo do tempo de forma escalonada, sendo que o das 12 primeiras corresponde a 0,666% da dívida consolidada, o das 12 seguintes a 1% do débito, o das parcelas 25 a 83 a 1,333%, e o montante da última prestação corresponde ao saldo devedor remanescente. Não há qualquer desconto aplicável a juros, multa, verbas de sucumbência, ou utilização de taxa de juros mais branda do que a Selic.
Apesar de o novo programa de parcelamento parecer ser uma boa novidade, especialmente diante do parcelamento ordinário de 60 meses, é pouco provável que, na prática, ele atenda às necessidades das empresas em recuperação judicial.
O que se esperava era a instituição de um programa que permitisse a concessão de prazos mais alongados
Empresas em recuperação judicial - tais quais muitas dos setores sucroalcooleiro e têxtil, dentre muitos outros segmentos - são sociedades que se encontram sujeitas a alto stress econômico-financeiro. A situação é tão grave que credores aprovam - ou são obrigados a aprovar - planos de recuperação concedendo descontos relevantes em seus créditos, abrindo mão de parcela significativa não só de acréscimos financeiros, mas também do próprio principal da dívida, recebendo o saldo remanescente em prazos longos, em muitos casos superiores a quinze anos (180 meses), com taxas de juros inferiores às de mercado.
Nesse cenário, o parcelamento específico introduzido pela Lei n. 13.043, de 2014, provavelmente frustrará muitas empresas em recuperação judicial no futuro. O que se esperava, não se pode deixar de dizer, era a instituição de um programa que permitisse a concessão de prazos mais alongados, possibilidade de quitar a dívida fiscal em parcelas calculadas com base em percentual do faturamento, taxas de juros menores, faculdade de utilização plena de prejuízos fiscais para quitar tributos e penalidades, oportunidade para parcelar inclusive tributos devidos no período corrente em prazos mais alongados, descontos aplicáveis a juros, multas etc.
A introdução do parcelamento novel pela Lei nº 13.043 sem tais mecanismos - ou pelo menos parte deles - cria uma situação inusitada, pois, ainda que os credores trabalhistas, civis e comerciais negociem e se sacrifiquem aprovando plano de empresas recuperáveis com concessões creditícias relevantes (que, não raro, envolvem altos descontos do principal), a dívida fiscal federal poderá ser parcelada pelas recuperandas apenas e tão somente nos termos engessados da referida lei, podendo comprometer seriamente o fluxo de caixa dessas ou até mesmo inviabilizar a recuperação, exatamente aquilo que a lei de falências e recuperações judiciais busca evitar.
Com o término de mais uma oportunidade de aderir ao Refis, ainda que possam eventualmente se socorrer do novo parcelamento instituído pela Lei nº 13.043, as empresas em recuperação provavelmente viverão na expectativa de introdução de novos programas de moratória fiscal mais realistas, que sejam condizentes com sua situação de fragilidade econômica. Nesse ínterim, poderão ter que encarar contenciosos fiscais complicados, com o risco de terem ativos importantes ao negócio penhorados e leiloados, o que, em última instância, poderá acarretar a sua falência, resultado indesejado pela Lei de Falências e Recuperações de 2005. Caberá ao Poder Judiciário equilibrar essa tensão.
Antonio Amendola, sócio de Dias Carneiro Advogados, Arystóbulo, Flores, Sanches e Thomaz Bastos