Com preço que acumula alta de mais de 130% nos últimos 12 meses, o algodão entra na agenda da indústria têxtil como um desafio a ser encarado em 2011. As empresas de produtos de cama, mesa e banho - em que a matéria-prima chega a representar 30% dos custos de produção - são as primeiras a sentir os impactos da alta e traçar estratégias para minimizar os efeitos e manter margens ao longo do ano. Para quem já enfrentava dificuldades acumuladas nos últimos anos, com concorrência de importados, valorização do real e perda de participação no exterior, o aumento dos preços tornou-se um agravante definitivo.
A negociação de preços foi fundamental para a Karsten, de Blumenau, garantir a pluma até a segunda metade deste ano. Segundo o diretor financeiro da empresa, Rildo Pinheiro, a alta começou a preocupar já no fim de 2010. A empresa foi uma das que se beneficiou da isenção do imposto de importação do produto. Em setembro, o governo federal decidiu baixar de 10% para zero o imposto de importação do algodão até maio de 2011 para 250 mil toneladas.
A Karsten importou cerca de 300 toneladas entre fios e plumas de algodão de fornecedores da Argentina e Estados Unidos. A companhia consome cerca de 1,2 mil de toneladas da matéria-prima, 600 toneladas delas em fios.
A medida do governo não chegou a beneficiar todas as empresas. Para Rolf Buddemeyer, diretor comercial da fabricante de produtos de cama, mesa e banho de São Bento do Sul, a medida foi inócua para frear o aumento dos preços, já que a demanda está aquecida no mercado internacional.
Carlos Alexandre Döhler, diretor comercial da empresa com sede em Joinville, avalia que a janela de redução de impostos não refrescou os preços. A Döhler optou por negociar com fornecedores brasileiros no fim do ano passado e diz que já tem matéria-prima garantida até a metade do segundo semestre deste ano.
Com dificuldade de adquirir matéria-prima, a Schlösser, de Brusque, paralisou as atividades no dia 2 de janeiro e concedeu licença remunerada a 450 trabalhadores. Com foco em tecidos para camisaria e confecções, a empresa discute agora se irá entrar em processo de recuperação judicial.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex), Ulrich Kuhn, acredita que outras empresas podem paralisar as atividades em virtude do aumento de preços. "Em alguns casos, é a gota dágua no copo que já estava cheio, prestes a transbordar."
Ao tentar minimizar os impactos no setor, a Secretaria da Fazenda de Santa Catarina tornou anual, em vez de mensal, a aferição da cota de importação de matérias-primas para a indústria, hoje limitada a 15%. O governo estadual também retirou as fibras sintéticas desta cota de importação e ajustou o ICMS cobrado do setor em 3%.
Döhler diz que o aumento do algodão fez com que a participação dos preços da matéria-prima ultrapassassem o custo de mão-de-obra, até então o principal componente. A empresa não ampliou o uso de fibras artificiais, como poliéster. "A Döhler não alterou a composições dos seus produtos e é bem provável que não o faço", diz o diretor. Para Buddemeyer, o uso de polyester na composição de 33% de peças acaba sendo rechaçado pelo consumidor. Por isso, na sua avaliação, o uso da fibra não deve avançar tanto neste setor.
Com a alta incorporada nos custos de produção, a dúvida das empresas é como será a recepção do consumidor aos novos preços dos produtos finais. Buddemeyer aposta em uma elevação média de até 30% no acumulado de 12 meses, com destaque para produtos que consumam mais a fibra, como as toalhas.
"O repasse não é simples. É necessário, porém difícil", diz Rildo Pinheiro, da Karsten. De acordo com ele, a empresa segurou a tabela de preços até o fim do ano passado. Mas artigos que utilizam mais algodão em sua composição podem sofrer reajuste entre 15% e 20% já neste trimestre, avalia.
A expectativa do setor é um arrefecimento dos valores com a entrada da safra, a partir de maio e junho. São esperados 1,8 milhão de toneladas segundo previsão da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), contra 1,1 milhão de toneladas colhida no ano passado.
Autor: Júlia Pittha
Fonte: Valor Econômico (14/02/2011)