Se for aprovado como está, o novo Código de Processo Civil (CPC), em tramitação no Senado, obrigará o setor industrial a desembolsar cerca de R$ 1 bilhão para cumprir suas exigências e acompanhar novas ações judiciais. Ao contrário de juristas, que apostam em maior celeridade do Judiciário, o setor produtivo entende que o texto atual trará mais insegurança jurídica, com um crescimento no número de processos e, consequentemente, do custo Brasil.
As medidas mais temidas estão relacionadas ao aumento de poder dos juízes. Um dos dispositivos do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 166, de 2010, por exemplo, deixa a cargo do magistrado determinar, em discussões sobre transações comerciais, por exemplo, a inversão do ônus da prova. A empresa acusada terá que provar que é inocente, como já acontece nas relações com consumidores. "Ao prever essa possibilidade, o projeto impõe maiores custos às empresas com a gestão de informações", diz Elias Marques de Medeiros Neto, diretor jurídico da Cosan e professor de direito processual civil. "A empresa necessitará de um preciso controle de documentação e histórico dos fatos."
O setor também está receoso com o fato de o juiz poder intervir na administração das empresas, removendo o poder de comando para obter provas - uma violação ao direito de propriedade, segundo a indústria.
Da lista de pontos críticos do texto elaborada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o advogado Hélcio Honda, diretor jurídico da entidade, destaca a desconsideração da personalidade jurídica - que permite alcançar os bens dos sócios. Ela passaria a ser cabível em todas as fases do processo, se o texto antigo do Senado, alterado na Câmara dos Deputados, for retomado. O projeto de lei já foi aprovado pelo Senado, mas, por ter sofrido mudanças, voltou à análise dos senadores.
Outro ponto preocupante, segundo Honda, é o que determina expressamente que a penhora on-line de dinheiro, em depósito em conta corrente ou aplicação financeira, será determinada pelo magistrado sem a necessidade de dar ciência prévia do ato ao executado.
Para Honda, não é necessário um novo Código de Processo Civil para reduzir a morosidade do Judiciário. "O ideal é investir mais na resolução alternativa de conflitos. A penhora on-line do faturamento da empresa faz com que ela tenha que tomar medidas judiciais para conseguir o desbloqueio e continuar operando", afirma o diretor jurídico, acrescentando que sócios também continuam a ter seus recursos penhorados. "Com o novo CPC, isso irá se disseminar ainda mais."
O prejuízo de R$ 1 bilhão para a indústria foi calculado pela Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE). Segundo o advogado Luciano Timm, diretor da entidade, o valor foi calculado com base nos honorários advocatícios mínimos previstos na tabela da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e no custo de cada processo, que gira em torno de R$ 5 mil na primeira e segunda instâncias. Levou-se em consideração ainda o aumento no número de ações judiciais gerado pela nova Lei de Recuperação e Falências - Lei nº 11.101, de 2005. Estima-se que as empresas gastaram cerca de R$ 500 milhões para acompanhar ao redor de 23 mil novos processos.
Outro custo alto seria com a conversão de "perdas prováveis" em "perdas possíveis", o que levaria as empresas de capital aberto a ter que fazer mais provisões para processos judiciais nos seus balanços. Isso porque existe a proposta de retirada do efeito suspensivo da apelação. Na prática, se a empresa for condenada na primeira instância, terá que cumprir com as sanções impostas imediatamente, mesmo que apresente apelação para tentar fazer com que a instância superior da Justiça modifique a decisão.
Além disso, segundo a indústria, os juízes poderão ainda conceder tutelas antecipadas de urgência (espécie de liminar) sem precisar basear-se em justificativas objetivas, como é exigido atualmente.
Hoje, os departamentos de relações institucionais de indústrias dos mais diversos segmentos trabalham para tentar barrar a aprovação do novo CPC neste ano. Em 2015, o perfil do Senado estará diferente, com maior participação da oposição. A indústria teme que o projeto de lei, nascido no Senado em 2009, sob a presidência de José Sarney (PMDB-AP), seja aprovado ainda este mês, a toque de caixa. Isso poderia acontecer porque o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), relator do projeto de lei, é presidente da CPI Mista da Petrobras e deve ocupar a vaga do ministro José Jorge, do Tribunal de Contas da União (TCU), que deve se aposentar amanhã.