"É preciso corrigir os pontos frágeis antes que eles acabem por influenciar negativamente seus resultados"
Já se vão mais de seis anos da entrada em vigor da Lei 11.101/2005, que estabeleceu um novo regime jurídico para tratamento das empresas em crise. Os avanços conquistados são inegáveis. Um grande número de empresas só se mantém operando no mercado, gerando empregos e pagando impostos, graças principalmente à recuperação judicial, que substituiu a obsoleta concordata. Foi a recuperação judicial que ofereceu meios para que os empresários pudessem programar a melhor forma de solucionar crises econômico-financeiras.
Soluções como a da Parmalat no Brasil foram comentadas mundo afora e serviram de modelo para tantos outros casos nacionais. Não há dúvidas de que vivemos hoje uma realidade muito mais compatível com as melhores práticas mundiais. Entretanto, agora que já se pode fazer um balanço dos resultados da lei nesses primeiros anos, fica claro que o relativo sucesso alcançado não afasta a necessidade de ajustes. As adequações são essenciais até para que se mantenham as conquistas.
A título de exemplo mencione-se a questão do financiamento do empresário que se encontra em processo de recuperação judicial. Precisa de dinheiro novo, para capital de giro e investimento. Os incentivos previstos na lei mostraram-se insuficientes e muitas vezes o empresário vê suas perspectivas comprometidas pelo custo e escassez de capital. Ao mesmo tempo, instituições financeiras e outros agentes passaram a realizar financiamentos através de figuras jurídicas que estão livres dos efeitos da recuperação judicial, como a 'cessão fiduciária', que algumas vezes atinge até créditos que estão por ser constituídos.
Como se trata de um contrato que sempre foi pouco utilizado, não tem um regime jurídico detalhado, nem limites ou restrições ao seu uso, o que leva à preocupante situação de desequilíbrio entre os titulares de créditos por cessão, que não se sujeitam aos efeitos da recuperação e os demais credores. A existência de dois grupos tende a levar ao aumento da dificuldade de aprovação do plano. Afinal, a aprovação se dá pelos votos dos credores que a ele se sujeitam, mas beneficia principalmente o outro grupo, dos credores por cessão fiduciária. Na mesma linha, surgem outras questões importantes, como a ausência de solução para as dívidas fiscais, de recuperação para sociedades de economia mista, cooperativas e grupos de empresas, de regras mais claras para o relacionamento da empresa em recuperação com o Poder Público e de melhor tratamento da recuperação extrajudicial, que por suas atuais limitações vem sendo subutilizada.
É preciso corrigir os pontos frágeis antes que eles acabem por influenciar negativamente seus resultados. O momento é de iniciativas que fomentem o debate sobre a atual estrutura e ofereçam subsídios para o aprimoramento das instituições (como ocorrerá no próximo Congresso do TMA, hoje e amanhã). O sucesso do modelo brasileiro se reflete em menores taxas de juros, maior índice de empregos e aquecimento da economia; é, portanto, um problema de todos nós.
Autor: Francisco Satiro Júnior Membro da TMA Brasil e sócio do escritório Satiro e Ruiz Advogados
Fonte: Brasil Econômico, jornal impresso, página 10 (29/11/2010)