O Supremo Tribunal Federal (STF) pode definir hoje um dos pontos mais controversos da nova lei de falências. Na prática, ao julgar a ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pelo PDT, a corte decidirá se há sucessão trabalhista na compra de ativos de empresas em recuperação judicial ou falida.
O resultado da decisão, se for favorável à transmissão das obrigações trabalhistas, atingirá diretamente as empresas e negócios envolvidos em processos de recuperação judicial ou falência e as aquisições dessa natureza - como nos casos da Varig e da Parmalat, primeiras empresas a entrarem em recuperação no país.
Além da Adin, também está previsto para ser julgado hoje um recurso extraordinário de uma ex-trabalhadora da Varig contra a VRG, ou a "nova Varig", adquirida pela Gol. Nesse caso, o que o Supremo decidirá é se os processos que pedem à VRG o pagamento de dívidas trabalhistas devem ser julga dos pela Justiça do trabalho ou concentrar-se na vara de falências da Justiça estadual, no caso a 1ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, responsável pela recuperação judicial da velha Varig e sob o comando do juiz Luiz Roberto Ayoub.
Os advogados Otávio Bezerra Neves e Sebastião José da Motta que representam o PDT na Adin e a trabalhadora no recurso extraordinário, pedem na ação direta de inconstitucionalidade que seja declarada a inconstitucionalidade do artigo 141 da Lei de Falências, a Lei n º11.101, de 2005. O dispositivo diz que os bens da empresa falida que forem alienados estarão livres de qualquer ônus e não haverá sucessão para quem os arrematar nas obrigações do devedor, seja fiscal ou trabalhista. Segundo Motta, esse artigo criou uma forma de demissão dos trabalhadores sem o pagamento de indenizações. "Os trabalhadores são tratados como uma coisa, um objeto. As obrigações da rescisão contratual são abandonadas", afirma. Para ele, a manutenção desse artigo terá reflexos futuros, pois todas as empresas em dificuldade correrão o risco de perder trabalhadores que podem antecipar-se à dificuldade financeira e pedir demissão. A constitucionalidade do dispositivo que trata da venda de ativos na recuperação judicial, o artigo 60, não é questionada, mas o advogado afirma que pede ao Supremo um esclarecimento sobre como o dispositivo dever ser aplicado."O Supremo vai ter de entrar na discussão se há ou não sucessão", diz.
Além disso, Motta afirma que se o tribunal julgar inconstitucional o artigo 141, ocorrerá uma aplicação "reflexa" desse entendimento ao artigo 60 no mesmo sentido do que for decidido para o dispositivo que trata de falência. O PDT também questiona na ação o teto de 150 salários mínimos fixado na ordem cronológica para recebimento de créditos no caso de falência. Os trabalhadores vêm em primeiro lugar na ordem de recebimento, mas há essa limitação imposta pela lei. Em segundo lugar recebem os credores com garantia real - na prática os bancos - e em terceiro os créditos fiscais. A Advocacia-Geral da União (AGU), que representará a presidência da República na Adin, vai apresentar hoje os argumentos ao Supremo em prol da constitucionalidade dos três artigos questionados na nova lei de Falências.
De acordo com Grace Maria Fernandes Mendonça, secretária-geral de contencioso da AGU, é fundamental que seja assegurada a previsão de não sucessão dos débitos trabalhistas e fiscais na compra de ativos das empresas em recuperação. "Desta forma está garantida a segurança do comprador de que a atividade poderá ser levada adiante", diz Grace. A AGU defende também a necessidade de se estabelecer um teto de 150 salários mínimos para o pagamento de créditos trabalhistas em caso de falência. Segundo Grace, o mecanismo torna viável a recomposição das contas. "O valor suprime demandas básicas e emergenciais e o possível excedente é pago na etapa final do processo de falência", afirma.
Autor: Zínia Baeta e Luiza de Carvalho
Fonte: Valor econômico (27/05/2009)