Depois de ficar mais de 30 dias parada por atraso no pagamento de salários e por falta de matéria-prima para produção, a fabricante de porcelana Schmidt viveu ontem um dia agitado, com a destituição de parte da diretoria por integrantes da família e recebimento de propostas de grupos interessados na empresa. Um deles é representando por Ismar Becker, filho de um dos fundadores da Oxford, de Santa Catarina. Nos próximos dias, o novo presidente, Nelson Lara, ex-diretor comercial da Schmidt por 23 anos, foi casado com uma das sócias e atuou como consultor na fabricante de panelas Panex e na concorrente Oxford, terá o desafio de fazer a empresa voltar a produzir e analisar qual a melhor saída para os problemas financeiros que se arrastam há anos e a levaram à recuperação judicial em 2008.
Nos últimos meses, mesmo com o agravamento da situação, os grupos interessados não conseguiam ter acesso às informações da empresa para levar os planos adiante. Em reunião realizada ontem em Campo Largo (PR), onde fica a maior unidade de produção, alguns sócios votaram pela saída de Harry Schmidt, um dos fundadores, que ocupava o cargo de presidente, e de seu filho Walter Schmidt, diretor financeiro. Os dois têm 32% das ações e estiveram no comando por mais de 30 anos. Foram mantidos Martin Schmidt, como diretor de produção, e Ingrid Schmidt, diretora de marketing e ex-esposa de Nelson Lara.
A Schmidt foi fundada há 65 anos e tem unidades também em Pomerode (SC) e em Mauá (SP). Lara afirma que é possível fazer a empresa voltar a funcionar e "retomar valores" do passado. "Me desliguei em 2001 por não concordar com os caminhos que estavam sendo tomados", diz ele, que é administrador e advogado. Nos últimos anos o executivo trabalhou na modernização da Studio Tacto, empresa de cerâmica que tem como sócios Ismar Becker (com quem vai negociar um possível acordo para compra da produção da Schmidt), e os empresários Marlene Barbieri e Alfredo Schöll, donos de revenda de carros, usina de álcool e exportadores de grãos.
"Até agora não tínhamos interlocutor", diz Becker. Segundo ele, não foi definida a figura jurídica que poderá ser usada no processo, mas não está prevista a aquisição de ações. "Achamos que há boa oportunidade de negócio." Ele cita o fato de que a Studio Tacto fazia 200 mil peças por mês há cinco anos e, hoje, produz 1,5 milhão. A empresa atua em segmento popular, ao contrário da Schmidt.
Lara diz que há mais dois interessados no negócio, um grupo do Rio Grande do Sul e outro estrangeiro. Segundo ele, de imediato, a Schmidt precisa acertar dívida de R$ 1 milhão com salários atrasados e de R$ 5 milhões a R$ 10 milhões serão necessários para voltar a produzir. Questionado se há risco de falência, ele responde que "é algo duro de aceitar" e acredita na volta do crédito e ainda em setembro a produção poderá ser reiniciada. Está nos planos vender imóveis que a empresa possui no Paraná. A segunda parcela da recuperação judicial vence em outubro.
O avanço na busca de uma saída para a Schmidt sela uma semana de boas notícias para o município de Campo Largo. Na quarta-feira a Caterpillar anunciou a instalação de uma unidade na cidade. No período de nove anos, a Caterpillar vai ser a terceira empresa a usar o mesmo imóvel. A montadora Chrysler ocupou o local até 2001, para fazer picapes. Depois entrou a fabricante de motores TMT Motoco, subsidiária da americana Tecumseh, que fechou as portas após entrar em recuperação judicial, em 2007. Um ano depois o terreno e o prédio foram vendidos para a construtora WTorre, de São Paulo, por R$ 75 milhões, e havia a intenção por parte da Electrolux de instalar uma fábrica no local, o que acabou não acontecendo.
O imóvel escolhido pela Caterpillar ficou fechado por três anos. Consultada, a WTorre não falou sobre a transação. Em julho o grupo Fiat inaugurou, em terreno não muito distante, separado por uma rodovia, uma fábrica de motores da FPT - Powertrain Technologies, em imóvel que antes foi da Tritec Motors, resultado de antiga parceria da BMW com a Chrysler, que também deixou de produzir em 2007. Enquanto aguardava o desfecho para a Schmidt e comemorava a chegada da Caterpillar, o prefeito Edson Basso (PMDB) contou que ficou atrás de investimentos desde 2007. "Não tem coisa mais triste que fábrica fechada."
Autor: Marli Lima
Fonte: Valor Econômico (03/09/2010)